segunda-feira, dezembro 26

Valter Antonio Noal Filho


"Os Viajantes Olham Porto Alegre" ganhou o Açorianos (de ensaios) deste ano! Este prêmio, para quem não sabe, é o Oscar da literatura gaúcha. Sábado, no Caderno Cultura de ZH, o livro ganhou duas páginas de comentários, trechos e ilustrações. A Zero Hora de hoje fez uma bonita e merecida homenagem ao Valter, na página 3, com direito à foto e tudo o mais. Na companhia do Mestre Guina presto aqui minha homenagem ao Valter, que traz para casa este belíssimo prêmio, que antes de mais nada é um reconhecimento mais do que merecido ao trabalho preciso e precioso que ele faz, quieto no seu canto.

quarta-feira, dezembro 21

Recesso de Natal

Estou fazendo um breve recesso de Natal. Volto logo. Do pouco que estou acompanhando da cena universitária federal, apenas ontem o comando nacional jogou a toalha, segundo a Folha. Ufa!
E a Bolivia? Um dos meus projetos de viagem era me internar na Bolivia, em algum momento deste ano, que só vai começar em maio (?), mas agora que a Petrobrás está na alça de mira dos bolivianos, sei não...
MAS vai dar o que falar... Luciana Genro foi conferir as eleições. Tarso Genro foi conferir as jogadas do neto no clássico juvenil, mão no queixo... Não se faz mais socialismo como antigamente... E se antigamente a coisa já era estranha, o que dizer agora?

quarta-feira, dezembro 14

Mais uma


A foto é de Paulo Fernando Machado. Trata-se de uma vista da cascata chamada Lava-Pés, próxima ao vizinho municipio de São Martinho. O arquivo me foi passado pelo Valter.

Cascatas, lendas e calendas

As redondezas da Boca do Monte oferecem belos riachos e dezenas de cascatas. O Valter - exímio nadador e habilíssimo no caminho das pedras - alegrou minhas retinas com fotos maravilhosas (do Paulo), de uma cascata chamada Lava-Pés, que vou tentar postar aqui. Assim, no que posso, ofereço meus préstimos ao Mestre Guina (salve!!!) e aos demais visitantes deste molhado blogue para uma excursão de lava-pés à esses recantos. Podemos comer o mingau pelas beiradas, iniciando por Ivorá, quem sabe, que tem lugares tão bonitos quanto esses outros.
Afinal (1), como foi muito bem observado alhures pelo referido Mestre, com a Copa do Mundo que vem por aí, quem sabe o semestre letivo começa pelas calendas de julho?
Afinal (2), greve cansa!

segunda-feira, dezembro 12

Mais argumentos para as alternativas para a canícula!!!


O gordinho (não se trata mais do editor de textos anteriormente mencionado) da foto (tomada por volta das 19.00 horas, o que explica, mas não justifica, a baixa qualidade da mesma) dá uma idéia das proporções das piscinas e cascatas que podem proporcionar um bom refresco para a canícula de janeiro, nas proximidades da UfSM!!!

Alternativas para um janeiro senegalesco?


Opções para a canícula de janeiro: na foto, um exemplo de uma boa alternativa de refresco para a canícula de janeiro. O paraíso gelado se encontra a poucos minutos de caminhada do balneário do Zimmerman, em Três Barras, ao módico custo de um real per escalpo, tarifário que o PL do MEC recentemente encaminhado à casa das leis pode certamente cobrir. O atleta que ilustra a foto, by the way, é editor de texto e programador visual de uma das mais importantes revistas de divulgação científica do sul do país.

Deu no Mix

O caderno Mix do final de semana traz uma entrevista com o Padre Lauro Trevisan, o do poder da mente. Nela, o padre assume sua condição de padre e diz, lá pelas tantas: "O dinheiro não traz felicidade, mas a felicidade traz dinheiro. Sacrifício e penitência são bobagens."
Eu só registro esse besteirol porque o dito cujo um dia fez os créditos do Mestrado em Filosofia da UFSM e quis defender uma tese, sobre o poder da mente. Felizmente o então Coordenador do Curso lhe informou que não ia dar. Vai daí que ele resolveu publicar o tal do livro, ficou rico, depois ficou milionário e comprou uma mercedez benz, bem faceiro, como se vê nas fotos da reportagem.
"Sacrifício e penitência são bobagens."
Como diria minha falecida avó, só dando nele com um gato morto, até o bicho miar.

Acabou

Hoje, dia 12 de dezembro, quase às vésperas de Natal, três meses e vários dias depois, acabou a greve na UFSM.

segunda-feira, dezembro 5

Hans Sluga em Santa Maria


Na quarta-feira, dia 7, às 20 horas, começa o Segundo Simpósio Internacional de Filosofia, do Programa de Pós-Graduação em Filosofia da UFSM. Ele será aberto com uma palestra de Hans Sluga, sobre o tema "A Verdade e a Imperfeição da Linguagem".
Hans Sluga nasceu e cresceu na Alemanha. Estudou em Bonn e Munique, onde conheceu a lógica moderna, filosofia da ciência e filosofia da linguagem, mas também estudou a obra de Heidegger. Estes estudos iniciais provocaram nele a convicção que a divisão entre filosofia analítica e continental é artificial. "Eu nunca me senti obrigado a assumir um lado nessa disputa estéril", diz ele.
Seus estudos continuaram em Oxford, onde trabalhou com R. M. Hare, Gilbert Ryle, e Michael Dummett. Foi também em Oxford que ele diz ter recebido a influência do pensamento de Wittgenstein, que se tornou decisivo para ele.
Depois de concluir seus estudos em Oxford, trabalhou por alguns anos na University College London (The University of London). Depois foi para a University da California, em Berkeley, onde está até hoje. Veja o que ele diz sobre seus interesses filosóficos:
"Eu tenho me interessado nesses anos todos por uma grande variedade de temas e autores. Em acréscimo a um interesse continuado nos começos da filosofia analítica (Frege, Russell e o primeiro Wittgenstein), eu tenho, mais recentemente, pensado sobre o conhecimento humano, e mais ativamente, sobre temas de filosofia política. Em minhas aulas eu tenho me interessado crescentemente também pelos escritos de Nietzsche, Heidegger, e Foucault. Depois de muitos anos de trabalho, sinto que agora começam a surgir alguns frutos."
A palestra de Hans Sluga será em inglês.

domingo, dezembro 4

Walt Whitman


O destaque literário do final de semana foi o lançamento de uma nova tradução do Folhas de Relva, de Walt Whitman (1819-1892). A publicação é da Iluminuras, e o autor da tradução é Rodrigo Garcia Lopes. Há comentários na Veja e na Folha de São Paulo, e a edição é bem elogiada. Vou colocar no Quadro de Avisos uma passagem das mais famosas do "Canto de Mim Mesmo".
Geir Campos e José Agostinho Batista, anteriormente, fizeram traduções de Whitman.

Filosofia em Zilbra

Zilbra é um país no qual a filosofia é muito cultivada. Pouca gente vive sem filosofia em Zilbra, onde também acontecem muitos encontros e congressos sobre tal flor da cultura. Para um desses encontros foi sugerido um texto sobre a busca de caminhos. Eis o início do resumo do texto:

"A leitura de um texto é um momento da leitura da vida. Vista desse modo, se insere no quadro de um acontecimento mais amplo, que inclui não apenas a possibilidade de interagir o mesmo, mas de exercitar o sentimento de fruição do ato de ler. Pois, quando o texto nos diz algo, participamos desse dizer ante aquilo que é sugerido, em sua estrutura, a um pensar que o ordena e perspectiva para acolher e recriar sentidos. O texto sugere caminhos, a serem reinaugurados a partir das relações virtuais que cada leitor possa estabelecer com as suas próprias experiências vivenciais e a sua posição parcial de observador."

Um leitor zilbreiro, que gostaria de entender o resumo, reclamou.
a) em que consiste "interagir o mesmo"?
b) "exercitar o sentimento de fruição do ato de ler" parece estar incluido nos acontecimentos mais amplos da leitura. O que ele deve concluir disso?
c) "ante aquilo que é sugerido" parece ter algo a ver com dizer algo, "a um pensar que o ordena"?. Mas o que isso quer dizer?
d) o leitor pode estabelecer "relações virtuais" com suas próprias experiências... Virtuais? E que tal ""próprias experiências vivenciais"?
Em Zilbra ou alguns filósofos gostam de escrever obscura e redundantemente, ou o fim de ano nos deixa um tanto cansados e de mau humor, o que explicaria o texto do resumo e o comentário.

quarta-feira, novembro 30

Boghossian

Um leitor do blogue e aluno do Curso de Filosofia propôs, por mail, algumas questões sobre o relativismo do conhecimento. O ponto de partida foi um artigo de Paul Boghossian sobre o famoso artigo de Alan Sokal, que conseguiu fazer com que uma importante revista de humanidades publicasse um artigo que era um besteirol sem fim. Para levar adiante a conversa, que parece interessar a muitos, tratei de colocar o artigo de Boghossian nos Arquivos, aqui do lado, no link. Vamos ver no que dá.

sexta-feira, novembro 25

A greve na maior universidade federal

Um leitor do blogue estava na dúvida sobre se a UFRJ entrou em greve. Não. Na assembléia do dia 10 de setembro a greve foi rejeitada. No dia 10 de novembro o assunto entrou em pauta de novo, e foi aprovado um indicativo de greve. Sem data... É bom lembrar que a UFRJ é a maior universidade federal brasileira. E a segunda maior é a Federal de Minas, se não me engano. Que não entrou em greve. E a Federal do Paraná, que não entrou em greve...

Ali Babá viu alguma coisa!

Sai no Mix de amanhã. Aqui vai uma versão mais leve, mas essencialmente a mesma.
O Deputado Babá (PSol) estava presente numa recente reunião com o MEC e o comando de greve dos professores das universidades federais e saiu-se com essa: ele acha que deve ser feita uma lei que exclui do reajuste quem não faz greve. Ele disse que “é fácil ficar na academia, dando aula e opinando sobre uma greve. Se vocês estivessem certos, já tinham convencido o Brasil inteiro”.
Babá tomou muito sol na cabeça. É uma bobagem isso que ele disse. E se a moda pega do outro lado e alguém propõe que os sindicatos de professores paguem retroativamente os prejuízos à formação do povo brasileiro com as paralisações intermináveis em todos os níveis de ensino, ano sim, ano não? Ou que os sindicatos sejam responsabilizados pelas trapalhadas nas negociações dos últimos anos, que, ao contrário de ganhos, podem ter provocado perdas salariais?
Mas Babá viu um negocio importante na segunda parte da frase, onde ele diz que “se vocês estivessem certos, já tinham convencido o Brasil inteiro”. O “vocês” do Babá, são mais ou menos 12.000 professores de universidades federais que desde o ano passado romperam com a Andes e constituíram outra entidade de defesa da categoria, que reúne universidades como a Federal do Rio Grande do Sul, de Minas, de Goiás, etc. Nessa atual campanha salarial, a tal entidade, denominada de Proifes, foi recebida no Ministério junto com a Andes e a discussão sobre a representatividade sindical ferveu.
Seria bom lembrar ao Babá o fato que se alguém está certo em uma opinião, isso nada tem a ver com êxito no convencimento dos outros. Mas isso seria uma sutileza. O que vale é que Babá prestou esse serviço de trazer a dissidência (logo ele!) para a cena.
Não sou filiado ao Proifes nem faço muita idéia do mesmo. Mas o tal Proifes é o sintoma de um sentimento um tanto vago e difícil de colocar em palavras. É um sentimento de que as coisas do nosso sindicalismo não vão muito bem, na medida em que as greves se banalizaram; os estudantes falam claramente em “greves de pijama”, greves de “ano sim, ano não”, greves do “fora todos”; e quem é que gosta do tom amarelo que acompanha os comentários sobre a qualidade da recuperação das aulas?
Babá tem razão. Há hoje um “vocês” que não pode mais ser ignorado. Alguns desses professores que tem falado contra as greves “ano sim, ano não” estão invertendo o conselho de Babá e responsabilizam a Andes por trapalhadas, como é o caso de colegas de Goiás. É só entrar no site deles e ver.
A greve desse ano foi deflagrada sem a participação das das grandes universidades federais brasileiras. Em particular, a maior delas, a UFRJ não entrou em greve. Ninguém deu muita bola para a UFRJ quando ela se posicionou contra, em setembro, dizendo que não havia condições de se colocar na rua um movimento forte. Ao contrário, foo deflagrada uma greve pelas beiradas, fraca, desunida; apostou-se no crescimento inercial da mesma, expondo à opinião pública um movimento fraco, fragmentado, de cintura e cabeça duras.

quinta-feira, novembro 24

Baudrillard: existe a realidade?

O NYT de domingo passado publicou uma entrevista com Jean Baudrillard. Como diz meu sobrinho e blogueiro Gabriel Pillar, vale a pena ler para dar umas boas risadas. Tem um trecho dela e um link para a mesma no Vertigo, ao lado neste blog.

CDM

A ironia da reunião do tal do Conselho de Cidadania de Santa Maria, que vai dar conselhos sobre um novo projeto para o CDM: a reunião vai ser feita no auditório da Fadisma! E o tal projeto, pelo que se ouve, vai ser de um enorme edificio multiuso, o que quer dizer: vamos continuar sem um auditório público na cidade. Desde que o Centro Cultural foi transformado em Teatro 13 de Maio, não há mais um auditório do municipio para eventos. Pelo jeito, vamos continuar sem. Sinal dos tempos e das sensibilidades (ou melhor, da falta delas...). E as próximas reuniões do Conselho da Cidadania, por certo, vão continuar sendo feitas em auditórios privados... Eta cidade!

segunda-feira, novembro 21

O direito de greve

A Comissão de Educação da Câmara, aproveitando a maré, diz que quer fazer uma proposta de regulamentação do direito de greve nas Universidades. Uma conversa fiada, para aproveitar o momento, pois ela fala em fazer uma lei específica para as universidades federais. É uma gracinha, pois o Deputado Paulo Delgado (PT) diz que "a idéia é estabelecer áreas essenciais que não possam ser paralisadas durante as greves, como as turmas dos últimos semestres nas áreas de saúde, tecnologia e pedagogia."
No Jornal o Globo, tem a repercussão dessas belas idéias.
"A presidente do Andes-Sindicato, Marina Barbosa, já se posicionou contra a proposta do deputado:
— O direito de greve está previsto na Constituição. Qualquer regulamentação irá restringir este direito. A greve causa transtornos. Infelizmente, é a única forma de sermos ouvidos.
O presidente da UNE, Gustavo Petta, concorda que os estudantes são as maiores vítimas das greves. Ele vê equívocos da parte do governo e do Andes nas negociações, mas pondera que o direito à greve é legítimo:
— Não se pode encarar com naturalidade essa situação de greve prolongada, mas não podemos também retirar um direito legítimo de professores e funcionários.
O ex-ministro da Educação Cristovam Buarque (PDT-DF) não vê como viabilizar a regulamentação. Quando era ministro, ele propôs que as greves só pudessem ser declaradas quando os três segmentos —- estudantes, professores e técnicos — concordassem:
— Uma greve que ultrapassa cem dias mostra que a universidade não é mais necessária da forma como está estruturada. Imagine um banco parado por cem dias.
Para Maria Helena Guimarães, da Universidade Estadual de Campinas, a forma de evitar os prejuízos que as greves causam é discutir uma proposta de autonomia das universidades. Ex-secretária-executiva do MEC no governo Fernando Henrique Cardoso e hoje secretária estadual de Assistência e Desenvolvimento Social de São Paulo, ela diz que o governo Lula deveria dar mais importância à autonomia universitária.
O ministro da Educação, Fernando Haddad, por meio de sua assessoria, informou que analisará a proposta de Delgado para depois se pronunciar."
Por aí afora. No domingo, no Diário de Santa Maria, no MIX, tem mais um round da discussão. Depois eu posto aqui o que escrevi, inspirado por uma dica do Prof. Robson Reis.

Bar

Perdi de novo. Vai ter chope no Bar. Falta a dança. Ultimamente, perco todas.

quarta-feira, novembro 16

Cesma

Mais uma conversa de pé de inauguração. O Café da Cesma, o futuro, deve vender cerveja e chope? Então vamos chamar logo de Bar da Cesma e botar um barrigudo de bigode por trás do balcão, oferecendo chopes com chucrutes de acompanhamento. Eu não nego que gosto de tomar um chopes com chucrutes de fez em quanto, mas vender chopes na Cesma... Então já teria nome o bar, Bar da Cesva... Francamente!

Desculpas

Imagino que os alunos do Prof. Róbson Reis tenham me aguardado hoje, às 10.30, para a aula sobre Filosofia da Linguagem Comum. Em vão. Peço desculpas a todos, é o que posso fazer, por ora. Eu me lembrei do compromisso perto do meio dia. Meus alunos sabem que não me atraso e não falto aulas marcadas. Mas hoje aconteceu. Aceitei de bom gosto o convite para dar essa aula, tinha tudo pronto, mas hoje - quem sabem a emoção da inauguração da Cesma, o mormaço de matar gente, a idade, quem sabe tudo isso e mais o que não se sabe bem o quê - tudo isso junto, faltei. Me adesculpem, se puderem. Devo, não nego, pago quando marcarem novo dia.

Cesma, 16 de Novembro, 16.30 h.

Ceres Zasso Zago, ao meu lado, na Cesma, comenta a chacina de trânsito do final de semana, trinta e poucas mortes. Mas não vai desistir de sua luta por mais calma no trânsito. Télcio Brezolin continua recebendo os cumprimentos das pessoas que não puderam vir pela manhã. Nos alto-falantes do salão principal a trilha sonora é feita com Madeleine Peyroux (semana que vem, no Teatro do Sesi). E uma conversa começa ao lado, sobre se o Café da Cesma, quando abrir, deve ou não vender cerveja. Dezenas de pessoas já andam pelos corredores de livros. Isto é Cesma, na primeira tarde de funcionamento. Faço esta postagem dentro da própria Cesma, que é um dos primeiros lugares de Santa Maria onde tem internet sem fio. Longa vida à Cesma.

quarta-feira, novembro 9

"O que era chamado de 'filosofia'"

No Livro Azul, Wittgenstein faz uma afirmação intrigante, diante da qual é difícil ficar indiferente: “Se, por exemplo, chamamos as nossas investigações 'filosofia', este rótulo, por um lado, parece apropriado e, por outro, tem seguramente induzido as pessoas em erro. (Poderíamos dizer que o assunto com que nos ocupamos é um dos herdeiros do que costumava ser chamado de 'filosofia'.)”. Esse tópico é abordado duas vezes no livro, no primeiro e no segundo ditado. Veja a página 110 da tradução de Jorge Mendes.
Um dos melhores artigos sobre esse tema foi escrito por Anthony Kenny, “Wittgenstein on the Nature of Philosophy” (publicado no livro The Legacy of Wittgenstein, Blackwell, 1984). Ali Kenny cita um manuscrito no qual Wittgenstein reflete sobre a diferença entre as coisas que ele diz e o que diziam filósofos anteriores:
“Uma pessoa comum, quando lê filósofos mais antigos, pensa –de forma bastante certa – ‘Puro absurdo!’. Quando ela me ouve, pensa – corretamente, de novo – ‘Nada além de truísmos triviais’. Esse é o modo como a imagem da filosofia mudou.”
Mais, sobre esse tema, no blogue de Linguagem.

terça-feira, novembro 8

O acordo entre os homens

Um dos parágrafos mais citados das Investigações Filosóficas de Wittgenstein é o 241:
"Assim, pois, você diz que o acordo entre os homens decide o que é verdadeiro e o que é falso?" - Verdadeiro e falso é o que os homens dizem; e na linguagem os homens estão de acordo. Não é um acordo sobre as opiniões, mas sobre o modo de vida."
Este parágrafo, com ligeiras adaptações e correções na tradução, foi objeto da questão 32 do Enade. Ela é assim:
(...). "Verdadeiro e falso" é o que os homens dizem; e na linguagem os homens estão de acordo. Não é um acordo sobre as opiniões, mas sobre o modo de vida.
De acordo com o texto acima, analise as seguintes asserções.
Na linguagem, os homens estão de acordo
porque
a linguagem concerne apenas à verdade e à falsidade dos enunciados.
Acerca dessas afirmativas, assinale a opção correta.
a) As duas asserções são proposições verdadeiras, e a segunda é uma justificação correta da primeira.
b) As duas asserções sao proposições verdadeiras, mas a segunda não é uma justificativa correta da primeira.
c) A primeira asserção é uma proposição verdadeira, e a segunda é uma proposição falsa.
d) A primeira asserção é uma proposição falsa, e a segunda é uma proposição verdadeira.
e) Tanto a primeira como a segunda asserções são proposições falsas.

E?

"As Obras do Amor"

Pela Vozes, ao preço de 47 reais, saíram "As Obras do Amor", de Soeren Kierkegaard. O tradutor do livro é um conhecido de Santa Maria, o Professor Alvaro Valls, que assim inicia o elogio do livro: "Na primeira página, coloca em dúvida a dúvida (cartesiana) quando aplicada ao amor. Não se deve duvidar do amor. Melhor ser enganado amando do que desistindo do amor. Melhor ser enganado amando do que desistindo de amar. Deve-se crer no amor." Com essa tradução, Valls amplia a obra de Kierkegaard ao nosso alcance: As Migalhas Filosóficas (Vozes), O Conceito de Ironia (Vozes), É Preciso Duvidar de Tudo (Martins Fontes), tudo traduzido do original dinamarquês.

A prova de Filosofia do ENADE (I)

A prova de Filosofia do Enade teve 10 questões de Formação Geral e 25 na parte específica de Filosofia. Destas, quatro foram de Lógica. Os autores cujos textos foram objeto de avaliação, no estilo de múltipla escolha, foram Demócrito, Platão, Aristóteles, Pirro, Tomás de Aquino, Ockam, Boécio, Abelardo, Locke, Descartes e Hume, Kant, Spinoza e Schopenhauer, Locke, Wittgenstein, Apel e Habermas, Sartre, Kuhn, Foucault. E ainda questões discursivas, de 15 linhas cada, abordando temas como a distinção entre verdade e validade na lógica formal, ato e potência, Agostinho, a ética de Kant, Carnap (metafisica e ciência).
A maioria das questões de múltipla escolha foram formuladas de modo a requerer não tanto o conhecimento das idéias do autor quanto uma capacidade de interpretação de textos. Com isso, a exigência de conhecimentos de Filosofia ficou, em muitas questões, quase que no mesmo pé de igualdade com a capacidade de análise de textos. O recurso é válido, por certo, e diminui a possibilidade de anular questões por divergências de interpretação de conceitos do autor. Para quem queria ter uma idéia sobre como podem ser formuladas questões de vestibular para conteúdos de Filosofia, talvez a prova do Enade seja um exemplo.

segunda-feira, novembro 7

Exame de Filosofia

No domingo de tarde ocorreu a prova do Enade, da qual participou o Curso de Filosofia. Algum aluno participante pode contar como foi a prova?

CESMA

Tem data a inauguração da nova sede da Cesma: dia 16 de Novembro. Tem gente vindo de longe para a cerimônia. A casa está ficando muito linda, mas não só isso. O estoque de livros foi ampliado, nova seção com devedês clássicos escolhidos a dedo, internet, café (talvez com internet sem fio), enfim, coisa sem comparação no mundo ao redor.

Errei

Fiz uma previsão e errei. Na greve de 1998, no dia 6 de abril, eu disse que a greve terminaria no dia 15 de junho. Acertei. Foi uma trágica sorte. Desta vez errei. A greve do Andes segue, por mais algumas semanas, quem sabe até o ano que vem. A da Receita Federal já tem oitenta dias e segue firme. A dos servidores da Universidade vai pelo mesmo caminho, que leva aonde mesmo?

sexta-feira, novembro 4

A língua materna pode ser vista como um instrumento?

A língua materna pode ser vista como um instrumento?
Nas discussões da DCG sobre Linguagem Comum surgiu o tema da linguagem como um instrumento. O tópico é relevante pois não é raro encontrar-se caracterizações da linguagem natural como um instrumento de expressão dos pensamentos (idéias, sentimentos, etc). Nossas reflexões na DCG tiveram como inspiração o texto de Hans-Georg Gadamer, “Homem e Linguagem” (disponível nos Arquivos, no link ao lado). Nele, Gadamer apresenta argumentos contrários às concepções instrumentalistas da linguagem, a partir de uma reflexão sobre a natureza e função dos instrumentos.
Para seguir nessa linha de reflexão, transcrevo o trecho final de uma passagem da Gramática Filosófica, de L. Wittgensteins, que aborda o mesmo tema.
“Onde a linguagem consegue sua significação? Podemos dizer ‘Sem a linguagem, não poderíamos nos comunicar um com o outro’? Não. Não é como ‘sem o telefone, não poderíamos falar da Europa com a América’. Podemos realmente dizer ‘sem boca, os seres humanos não poderiam comunicar-se entre si’. Mas o conceito de linguagem está contido no conceito de comunicação.” (Gramática Filosófica, §140)
Acho que a ultima frase fala por si. Ou não?

segunda-feira, outubro 31

Tudinha

"Tudinha" está na rua. Tem 64 páginas, o número zero, um grampo no meio, é revista, portanto, embora pareça um jornal. Lembra o melhor da imprensa alternativa, uma diagramação ousada e muita coisa para ler. A gente tem que dizer: uma baita surprêsa, "Do Alegrete para o resto do mundo em volta", uma coisa de iniciativa e força que não é comum, o que será que botam no chimarrão por lá? De fazer pensar, isso sim, pois junto, no pacote que trouxe os exemplares de Tudinha (quase todos já distribuídos, na Cesma, com o Télcio, outro para o Diretório dos Estudantes da Filosofia), outros pacotes, com a coleção de livros "Alfonsina (y el mar)", uma coleção de nove títulos "de gente que vive na região" ou que tem laços com ela. Estou lendo um pouco de cada um, para forma uma idéia, mas a idéia mais importante me parece ser essa, como diz a Tudinha: fazer com que os autores apareçam e cresçam a partir do diálogo de seus escritos com o público; tem desde o livro de um menino de onze anos, "A Velha do Gato", Lucas Mulazzani, que conta "causos de guri", coisa mais linda, os versos em tons reflexivos de Eliane Rubim ("Sócrates era hipócrita/ele sabia seu doer/eu também sei/mas não o creio"), uma antologia de prosa e poesia de uma oficina de literatura, e coisa de gente lanhada, como as sutilezas de Ana Christello (Em "Nadar de Costas" -"os sonhos é que são generosos, decolam a nossa ansiedade e ainda permitem que aterrisemos nossas ânsias em qualquer terreno"), enfim, tem muito mais: Russel Vaz Moraes, inserido na tradição de poesia social, com 'Pasto'; Virginia de Almeida Pires traz um pequeno livro de análise de ideologia; Amália Cardona Leites, que estréia com poemas muito delicados, em "Ruído" (Alice sem coelho/para seguir); depois eu conto o resto.

"Discutindo Filosofia" (nas bancas...)

Uma editora paulista lançou aquela que talvez seja a primeira revista mensal exclusivamente dedicada à Filosofia. Chama-se "Discutindo Filosofia". Comprei ontem numa banca do centro da cidade, por 6,90 (Ano I, n. 1). A diagramação, projeto gráfico, essas coisas, são bem convencionais, e o conteúdo vai na mesma linha. A matéria de capa é sobre Sartre (no dia 21 de junho deste ano fez cem anos do nascimento do mesmo), outra sobre o cogito cartesiano, cujo título não poderia ser mais tradicional ("Penso, logo existo"); mas tem Leibniz (sobre liberdade de escolha), estética de Hegel, diagramas de Venn, ética e política, livros; há uma entrevista com Celso Favareto, professor de Filosofia da Faculdade de Educação da USP. Não conheço o coordenador, Homero Santiago, e as pessoas que escrevem são, vários, doutorandos e mestrandos da USP, professores de Filosofia de diversas universidades de São Paulo, outro do Rio Grande do Norte, vai por aí. Pelo que se pode ver na segunda capa da revista, ela faz parte de uma série "Discutindo" Arte, Ciência, Educação Física, Geografia, História, Literatura.
Achei na Banca 24 horas.

quarta-feira, outubro 26

Mora na Filosofia no cinema

Moranafilosofia, o filme. Em Curitiba, no Nono Festival de Cinema, Vídeo e Dcine está inscrito um filme chamado "Mora na Filosofia", de Gustavo Acioli, no gênero Ficção, em 35 mm, com nove minutos. Foi feito no Rio de Janeiro, em 2004. A sinopse é esta:
"Através de uma colagem de diálogos de Platão, o filme constrói uma desconcertante parábola sobre o Brasil". Tem indicação de prêmios para direção, roteiro, fotografia e música.

quinta-feira, outubro 20

Denise Frossard e uma correção importante

PORQUE VOU VOTAR SIM PARA O DESARMAMENTO

Denise Frossard


No início de 2003, quando tomava corpo o debate sobre o desarmamento, duas posições radicais e antagônicas estavam presentes. Uma defendia a pura, simples e integral proibição do comércio de armas, porque isso provocaria redução substancial da criminalidade, e a outra patrocinava o comércio completamente livre, sem amarras legais, porque andar armado seria um direito do cidadão sobre o qual o Estado não deveria intervir e, em defesa dessa sua tese, apontava-se um absurdo argumento da possibilidade de aumento da criminalidade no caso da proibição.

Chamada ao debate, em maio daquele ano (2003), preparei um artigo que ganhou o título “Os danos da proibição”, no qual defendi a regulamentação do porte de armas e falei do risco de se proibir sua comercialização de maneira integral e completa. Elogiei a legislação que melhorava o controle e limitava o porte de armas de fogo e alertei a população para a necessidade de cobrar a adoção de medidas complementares, porque a simples proibição ou regulamentação, sem outras medidas, não produziria os reflexos esperados sobre os números da criminalidade.

Depois de apresentar dados do mercado clandestino de armas e falar das experiências da Lei Seca e da reserva de mercado de informática, que estimularam o mercado negro de bebidas e computadores, afirmei: “(...) é bom retirar do debate a idéia equivocada de que os que são contra a mera proibição estão no pólo oposto da argumentação, propondo ‘às armas, cidadãos’. Não é assim. Acredito na eficiência da regulamentação e no controle rigoroso da fabricação, do porte e da importação de armas. Acredito na responsabilização direta e penal de todo aquele que, mesmo não portando armas, estimule o porte ilegal. Venho defendendo publicamente esses pontos de vista desde o começo dos anos 90. O caminho do controle foi tomado em fevereiro de 1997, com a edição da lei 9.437(...). Recentemente o Senado melhorou ainda mais a lei, aprovando um projeto que, entre outras medidas, torna o porte ilegal de armas um crime inafiançável. A proposta do Senado será submetida à Câmara, onde terá o meu apoio.”

Quem reler o artigo “Os danos da proibição”, comparando-o com o Estatuto do Desarmamento, que nasceu sete meses depois, encontrará coincidências evidentes, porque, em maio, eu pedia a regulamentação e a limitação do porte de armas de fogo, o que aconteceu, em dezembro, com o Estatuto do Desarmamento.

O Estatuto do Desarmamento, o referendo, a lei 10.867, de 12 de maio de 2004, e o decreto 5.123, de 1 de julho do mesmo ano, surgiram na direção do bom senso que sempre defendi, um sentimento que percebi quando escrevi, no término do artigo “Os danos da proibição”: “A proposta do Senado será submetida à Câmara, onde terá o meu apoio.”

Sinto-me obrigada a retornar ao assunto, porque, na internet, claramente com o objetivo de confundir, numa atitude de baixa política e de leviano comportamento, circula o artigo publicado em maio de 2003, que está disponível em minha página na internet. Circula com um tom que não lhe dei e com um sentido que não tinha e não tem, para atribuir a mim, a partir do título, “Os danos da proibição”, a preferência pelo “não”, na resposta ao referendo. Com as mesmas intenções, um jornal do Rio de Janeiro, sem previamente me ouvir, resolveu, há poucos dias, republicar o artigo. Sei quem o fez, porque mandei apurar.

Perdem tempo com este jogo bobo, porque a minha opção pelo desarmamento é clara, indiscutível, e está demonstrada até pela minha decisão pessoal de nunca andar armada, mesmo tendo porte legal e passado por momentos na vida em que muitos aconselhavam o contrário.

De maneira definitiva: votarei “sim” no referendo, e com o meu voto estarei confirmando a minha opção pelos dispositivos do Estatuto do Desarmamento e das leis que limitam e regulamentam o porte de armas de fogo.

DENISE FROSSARD é deputada federal (PPS-RJ).

quarta-feira, outubro 19

Ryle

O Arquivo 09, com comentários sobre Ryle e a linguagem comum já está disponível nos Arquivos.

terça-feira, outubro 18

Ilíada (1)

Existem, ao que parece, três traduções da Ilíada para o português. Uma, do século retrasado, de Odorico Mendes. Era a que eu tinha e que perdi de forma inexplicável. Ou melhor, imperdoável. A outra, em verso, mais recente, de Carlos Alberto Nunes, ainda encontrável, pela Ediouro, baratinha. A primeira chamava Aquiles de Aquileu Peleida, o máximo! E a terceira é a de Haroldo de Campos, que comprei hoje na Cesma, e da qual copiei a primeira frase. Parece que tem uma quarta tradução, feita em Portugal por Frederico Lourenço, não sei a editora. O Peleio Aquiles é o símbolo da ira, da raiva, ménis, em grego, a primeira palavra no original grego. O que não quer dizer pouco: o primeiro relato do mundo ocidental começa com muita ira. Mas afinal, porque brigavam tanto, porque tanta raiva entre o Atreide e o divino Aquiles?

A Ira de Aquiles


"A ira, Deusa, celebra do Peleio Aquiles,
o irado desvario, que aos Aqueus tantas penas
trouxe, e incontáveis almas arrojou no Hades
de valentes, de heróis, espólio para os cães,
pasto de aves rapaces: fez-se a lei de Zeus;
desde que por primeiro a discórdia apartou
o Atreide, chefe de homens, e o divino Aquiles."

O doente e o culpado

Sobre a dificil situação da educação no Brasil, vale conferir uma entrevista com um professor na ultima Carta Capital. Veja a matéria nesse endereço:
http://cartacapital.terra.com.br/site/index_frame.htm

segunda-feira, outubro 17

Thoreau e as armas


Thoreau escreve sobre armas, caçadas e pescarias no capítulo intitulado Leis Superiores, em Walden. Não sei de nenhum outro pensador que tenha escrito sobre essas coisas. E qual escritor teria dito uma frase assustadora como essa: “Não podemos deixar de ter pena do garoto que nunca disparou um revólver; ele não se tornou mais humano, ao passo que sua educação foi tristemente negligenciada”.
Eu deveria deixar esse assunto assim mesmo, para que o leitor se sentisse provocado a entender como é que um romântico e trancendentalista como Thoreau pode dar sentido a uma frase como essa. Mas vamos votar sobre armas nesta semana e vou abrir meu voto, pelo sim, no contexto da reflexão à margem do lago Walden.
A frase de Henry Thoreau (1817-1862) foi escrita num mundo um tanto diferente do nosso, em muitos sentidos: ainda havia muita natureza intocada, nenhuma grande guerra, um certo otimismo ainda era possível de ser nutrido; caçar e pescar faziam parte dos divertimentos “mais primitivos e solitários”; “na minha geração quase todo garoto da Nova Inglaterra, entre os dez e os quatorze anos, carregou às costas uma espingarda”. Mas, diz ele, se o convívio com as armas pode fazer parte de nossa educação, abandonar as armas de fogo também está no nosso caminho “para a vida espiritual”. Somos dois, sempre, queremos de um lado “agarrar a vida cruamente e passar o dia ao jeito dos animais”, mas também temos “um instinto voltado para as coisas elevadas”. Ao recomendar que os garotos experimentem as armas, Thoreau acrescenta, no mesmo parágrafo: eu confio que eles vão superar isso, “nenhum ser humano, passada a fase de estouvamento da infância, irá irresponsavelmente assassinar qualquer criatura, que valoriza a vida pelo mesmo título de posse que ele. A lebre em sua hora extrema chora que nem uma criancinha.”
“Ando disposto a abandonar a arma de fogo”, diz ele, e disso se segue, entre outras coisas, uma reflexão sobre nossos hábitos alimentares: “Quaisquer que sejam minhas práticas de alimentação, estou convicto de que faz parte do destino da raça humana, em seu progresso gradual, abandonar o hábito de comer animais, do mesmo modo que as tribos selvagens abandonaram a antropofagia ao entrarem em contato com os mais civilizados”.
Quaisquer que sejam as nossas práticas de convivência e de alimentação, precisamos pensar em que tipo de mundo queremos conviver; podemos votar para continuar a caminhada para adiante da antropofagia; ou em voltar um pouco para ela.

(Usei a tradução de Astrid Cabral: Henry D. Thoreau. Walden ou a Vida nos Bosques e a A Desobediência Civil. Editora Aquariana, São Paulo, 2001. A caricatura de Thoreau é de David Levine)

domingo, outubro 16

Final de Semana

Frio, chuva, horário de verão em pleno inverno. Bom tempo para ficar em casa atualizando, por exemplo, o arquivo de músicas no hd. Agora mesmo estou ouvindo o Black Cadi, do Lightnin' Hopkins, mas a colheita melhor do dia foram velharias dos anos cincoenta, como o Eddie Calvert tocando "Cherry pink & apple blossom...", a gravação original usada na trilha sonora do filme sobre Iris Murdoch (na cena do baile, quando ela era jovem, dançando cha cha cha...). Uma viagem no tempo!.
Uma dica: quem busca material bibliográfico na Internet - livros eletrônicos, por exemplo - não pode deixar de visitar o blog cujo link está ao lado, de Raúl M. Sullivan. Raúl fez uma reforma no blog e as informações ali disponíveis são preciosas.

sábado, outubro 15

Filosofia em nova casa


Na próxima sexta-feira, dia 21, ocorre a inauguração de um pedaço da nova casa do Departamento de Filosofia da UFSM. E até o dia 15 de dezembro as salas de aula ficam prontas, segundo o mestre de obras. Em março (ou abril, ou maio, ou junho, sei não) as aulas recomeçam por lá, na casa nova. Será a nossa terceira casa no Campus. A primeira sede da Filosofia foi no atual prédio do CCR próximo ao Planetário. Ali funcionava Filosofia, Geografia, História, Letras, Matemática, Pedagogia, no conjunto do que se chamava "Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras". Com a criação dos Centros, no início fazíamos parte do Centro de Estudos Básicos. Depois, com nova reforma, foi criado o Centro de Ciências Sociais e Humanas.

quinta-feira, outubro 13

Texto sobre Filosofia no Currículo

Nos Arquivos (a partir do Quadro de Avisos, ao lado) postei um texto longo intitulado "O Espaço da Filosofia no Currículo Escolar". Trata-se da minha contribuição para o livro de 2004 da Unijuí sobre ensino de filosofia, no qual fiz uma pequena revisão. Distribuí esse texto em uma atividade de formação de professores no PEIES, em 2004, como uma contribuição para o debate sobre o lugar da Filosofia nos currículos.

Esclarecimentos


Primeiro: as belíssimas caricaturas que tenho usado para ilustrar algumas postagens são de David Levine, ilustrador do New York Review of Books. Como assinante da revista, tenho me dado o (discutível) direito de pegar emprestado algumas para ilustrar o morana. A que está ilustrando essa postagem é de T. S. Eliot.
Segundo: o texto que está abaixo do título "Não devemos cessar de procurar... ("We shall not cease from exploration And the end of all our exploring will be to arrive where we started and know the place for the first time") de T. S. Eliot está nos "Quatro Quartetos". A tradução de Ivan Junqueira é mais refinada, mas no final eu estranho um pouco a solução dele: "Não cessaremos nunca de explorar E o fim de toda a nossa exploração Será chegar ao ponto de partida E o lugar reconhecer ainda como da primeira vez que o vimos." Eliot está traduzido pela Editora Nova Fronteira, SP, 1981. O título é "Poesia".
Esses versos são muito citados. A primeira vez que tive contato com eles foi num filme, que assisti ainda muito jovem, do qual não tenho nenhuma outra lembrança a não ser a da cena de um homem dizendo esses versos em uma praia do Mediterrâneo, talvez, próximo a uma mulher, talvez. Na Faculdade, li o livro de Gerd Bornhein, "Introdução ao Filosofar", que tem esses versos na página de rosto. O mais recente e ilustre filósofo que sei que usou esses versos na primeira página de seu livro foi Robert Brandon, em "Making it Explicit".

quarta-feira, outubro 12

Dia da Criança


Está na moda a Filosofia para/com(?) Crianças. Em pouco tempo o mercado de trabalho nesse nível será maior do que o de nível médio. Não quero discutir os méritos disso aqui, tem gente boa metida nisso, assim como tem muito deslumbramento e conversa fiada. No Dia da Criança me lembro que um dos filósofos que mais incluiu a criança como um elemento importante para suas reflexões foi Wittgenstein. Como diz Cavell, a abertura das Investigações é uma cena de instrução (Agostinho fala sobre como pretensamente teria aprendido a falar) e os tópicos da criança e o sentido da educação estão presentes em muitos momentos desse livro. O tema é ampliado ainda mais em Sobre a Certeza. Para conferir em Sobre a Certeza: veja os parágrafos 106 (a primeira ocorrência direta do tema) e seguintes; 128; 143; 144; 159 e seguintes; 283; 314 e seguintes; 374; 449 ss; 472 ss; e de 527 até praticamente ao fim do livro; para o tipo de propósito que Wittgenstein tem em "Sobre a Certeza", pensar sobre a criança, educação e a aprendizagem é algo fundamental. Isso valia um seminário junto com o pessoal da Educação.
Um comentário mais amplo sobre isso é feito pelo Professor Michael Kober (esteve aqui em Santa Maria no ano passado, gente finíssima!) no Cambridge Companion sobre Wittgenstein, p. 420.

domingo, outubro 9

Um poema do João

Um leitor do blogue declarou-se em estado de admiração diante da Vida e Morte Severina, de João Cabral de Melo Neto. Reparto com ele e com os leitores o meu favorito do mesmo autor.

Rios sem discurso

Quando um rio corta, corta-se de vez
o discurso-rio de água que ele fazia;
cortado, a água se quebra em pedaços,
em poços de água, em água paralítica.
Em situação de poço, a água equivale
a uma palavra em situação dicionária:
isolada, estanque no poço dela mesma,
e porque assim estanque, estancada;
e mais: porque assim estancada, muda,
e muda porque co nenhuma comunica,
porque cortou-se a sintaxe desse rio,
o fio de água por que ele discorria.
*
O curso de um rio, seu discurso-rio,
chega raramente a se reatar de vez;
um rio precisa de muito fio de água
para refazer o fio antigo que o fez.
Salvo a grandiloqüência de uma cheia
lhe impondo interina outra linguagem,
um rio precisa de muita água em fios
para que todos os poços se enfrasem:
se reatando, de um para outro poço,
em frases curtas, então frase e frase,
até a sentença-rio do discurso único
em que se tem voz a seca ele combate.
(João Cabral de Melo Neto)

quinta-feira, outubro 6

Como Ouvir

Dias atrás fiz uma brincadeira, em um painel da Semana Acadêmica da Psicologia, dizendo que assim como Sócrates é um dos ícones da Filosofia, Plutarco poderia ser um ícone da Psicologia. Como se sabe, há uma associação entre Psicologia e escuta; por vezes se pensa o psicólogo como o profissional da escuta ("orelhas em aluguel", alguém já escreveu. Ora, Plutarco é o autor de um livro dedicado à arte da escuta, talvez um dos únicos jamais escritos. A boa notícia vem agora. Ontem, estava xeretando na Cesma (aproveitem para se despedir da sede atual, parece que Novembro começa em casa nova) quando me deparei com o cujo, "Como Ouvir", de Plutarco, publicado pela Martins Fontes, por módicos quinze reais. É uma delícia de livro!

terça-feira, outubro 4

As armas

Em um comentário pessoal, o Prof. Frank Sautter indicou uma possivel tipologia de argumentos pró e contra a comercialização de armas de fogo. Quem vota pela proibição usualmente invoca princípios de fundo pacifista; quem vota pela continuidade do comércio usualmente invoca o cenário da insegurança pública. Assim, os argumentos em certo sentido se movem em territórios conceituais distintos. Não estou seguro de fazer justiça à observação dele. Com o passar da campanha, no entanto, os argumentos estão se embolando, pois a turma das armas está usando muito o argumento de direitos individuais de escolha, e a turma da paz invoca estatísticas que mostram a relação entre armas e mortes no cotidiano e a pouca chance do "cidadão de bem" diante do "bandido" preparado para matar. O que é notável é que esse tipo de expressão tola acabou pegando nas duas campanhas: temos a cidadania do bem e a cidadania do mal.
O único Homem de Bem que eu conheço é o cantor.
Eu não li a Veja desta semana, mas, pela propaganda, tenho a impressão dela ter cometido um grave e consciente desserviço: ela dá a entender que o desarmamento é do "governo", e com isso as pessoas pensam em um dos poderes, o executivo. Ora, trata-se de legislação federal, fora do campo de ação estrito do poder executivo. Talvez a Veja queira dizer com "governo" os três poderes? Sei não, mas Aristóteles diria que se trata de um uso equívoco.

segunda-feira, outubro 3

Greve' (3)

Na reunião da sexta-feira, foi essa a proposta do MEC:
"Transformar o atual GT em GT para reestruturação da carreira, no qual será tratado também o tema da incorporação das gratificações."
"Com base em um cronograma imediato, discutir duas medidas. A primeira seria a criação da classe de Professor Associado. Existem, de acordo com secretário, 12 mil professores represados na posição de Adjunto IV, em condições de ascender para a nova classe, sendo o interstício salarial de 10%. Os critérios para a progressão deverão ser tratados nas próximas reuniões. A segunda seria um aumento de 50% nos incentivos de titulação, o que, segundo o Secretário, resultaria em um reajuste médio do total da remuneração de 9,47%."
Ou seja, o que já estava proposto antes da greve.
Próxima reunião, dia 7 de outubro.

quarta-feira, setembro 28

Escolhas


O discípulo pergunta ao mestre:
- Como podemos nos tornar sábios?
O Mestre responde:
- Fazendo boas escolhas.
- E como fazemos boas escolhas?
- Experiência - acrescentou o Mestre.
- E como adquirimos experiência?
- Más escolhas - disse o Mestre.

Gramática e Metafísica

Tem material novo no blogue de Linguagem, sobre Gramática e Metafísica. São notas que podem ajudar na leitura do texto de Stanley Cavell, Declinando do Declínio - Wittgenstein, filósofo da cultura.

Argumentos para o debate. Com a palavra, Denise Frossard

Os danos da proibição de armas

Denise Frossard*

O bom senso, sob o fogo cerrado da proposta de proibição do comércio legal de armas, pode ser mais uma das vítimas da ingenuidade ou violência branca da demagogia. O que se pretende com a proibição? Reduzir a criminalidade é a resposta, tão imediata quanto impensada, que nos vem à cabeça. Mas é uma resposta equivocada. A proibição do comércio legal de armas não fará recuar nem um milímetro a ousadia do crime (organizado), não baixará a taxa de delinqüência das ruas nem mesmo trará o conforto de diminuir a sensação de insegurança que, hoje, atinge em graus variados a sociedade brasileira. A proibição do comércio legal de armas, como o simples aumento de penas, a mudança do fardamento da polícia, tantas outras medidas (anunciadas ou já implementadas), tem sobre a criminalidade o mesmo efeito de um arco-íris no céu: uma ilusão bonita aos nossos olhos.
No caso da proibição do comércio de armas, a falsa sensação produzirá, no entanto, um efeito danoso: retirará do Estado a possibilidade de controle (ainda que frágil, como agora) e dificultará ainda mais a investigação de crimes praticados com esse recurso.
Proibida a comercialização, o Estado não terá mais instrumentos para o controle da circulação de armas. Como a sensação de insegurança persistirá, porque as verdadeiras causas da criminalidade (corrupção e impunidade) não são resolvidas em razão das deficiências do Estado, o mercado inteiro de armas de fogo irá para a clandestinidade.
As provas desse argumento são muitas. Uma delas está no documento "Fiscalização de Armas de Fogo e Produtos Correlatos", publicado pela imprensa, elaborado pelo coronel de infantaria Diógenes Dantas Filho, que, em conjunto com o Ministério Público Militar Federal, articulou uma ação policial militar para apreensão de armas clandestinas no Rio de Janeiro. O trabalho mapeia as rotas utilizadas pelo tráfico de armas e confirma a existência, em circulação, no Brasil, de 20 milhões de armamentos sem registro, em contraposição a 2 milhões de armas registradas.
É uma absurda ingenuidade de uns (e razões suspeitas de outros) imaginar que, diante da proibição do comércio legal, ninguém mais comprará ou deixará de portar armas. O mercado não vai estancar simplesmente porque o Estado proibiu a comercialização. Historicamente não tem sido assim.
Quem não se lembra da Lei Seca, nos EUA, ou da reserva de mercado de informática, no Brasil? Nos dois casos, e em muitos outros que a experiência de proibições comerciais mundo afora construiu, cresceu o mercado clandestino e o contrabando.Esse é o terreno fértil para aumentar a corrupção.
A medida certa está no controle da fabricação e do porte de armas de fogo, e não na proibição da comercialização. Nesse ponto, é bom retirar do debate a idéia equivocada de que os que são contra a mera proibição estão no pólo oposto da argumentação, propondo "às armas, cidadãos". Não é assim. Acredito na eficiência da regulamentação e no controle rigoroso da fabricação, do porte e da importação de armas. Acredito na responsabilização direta e penal de todo aquele que, mesmo não portando armas, estimule o porte ilegal. Venho defendendo publicamente esses pontos de vista desde o começo dos anos 90.
O caminho do controle foi tomado em fevereiro de 1997, com a edição da lei 9.437, que estabeleceu condições para o registro e o porte de armas de fogo e, mais relevante, configurou como crime possuir, deter, portar, fabricar,
adquirir, vender, alugar, expor à venda ou fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder (mesmo que gratuitamente), emprestar, remeter, empregar, manter sob guarda e ocultar arma de fogo, de uso permitido, sem a autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar.
Até 1997, o porte ilegal de armas era uma simples contravenção penal. A partir de então, com a lei 9.437, passou a sercrime, com pena de prisão. Recentemente, o Senado melhorou ainda mais a lei, aprovando um projeto que, entre outras medidas, torna o porte ilegal de armas um crime inafiançável. A proposta do Senado será submetida à Câmara, onde terá o meu apoio.
Apesar de não produzir resultados efetivos para o esforço de redução da criminalidade, que, comprovadamente, tem causas mais graves, a proposta para proibição do comércio legal de armas acabará sendo apresentada à população como um milagroso remédio. E nisto está o segundo, e talvez mais importante, equívoco. Sendo aprovada a proposta e em nada resultando no que concerne à necessidade de redução da criminalidade, veremos aumentar a incredulidade da
população com as medidas que venham do Estado. Com isso, continuaremos perdendo um importante aliado na luta contra o crime: a confiança do cidadão no Estado.

DENISE FROSSARD é Juíza de direito aposentada, fundadora da Transparência Brasil e deputada federal pelo PSDB-RJ.
(Agradeço ao Luis Valério o envio do texto como contribuição para essas conversas sobre os argumentos e sobre o referendo)

A Segunda Emenda e "Pense"

Lembrei da Segunda Emenda por causa de um dos melhores livros de introdução à filosofia que já li. Trata-se de "Pense - Uma Introdução à Filosofia", de Simon Blackburn, o mesmo autor do Dicionário de Filosofia da Oxford. O livro saiu pela Editora Gradiva, de Lisboa, em 2001. Tem 8 capítulos, Conhecimento, Mente, Livre Arbítrio, O eu, Deus, Raciocínio, O mundo, O que fazer.
No capítulo "Raciocínio", ao falar sobre a importância dos dispositivos quantificacionais na lógica como auxiliares para a dissolução de certas ambiguidades da linguagem comum (O exemplo mais surrado é "Todas as moças bonitas gostam de um rapaz") ele toma uma posição sobre a posse de armas pelos cidadãos nos EUA. Veja:
"Uma ambiguidade relacionada com esta é responsável por cerca de trinta mil mortes por ano nos Estados Unidos. "Sendo necessária uma milícia bem regulamentada para a segurança de um estado livre, o direito do povo de ter e usar armas não será infringido." Quem não terá os direitos infringidos? Cada pessoa? Ou todas enquanto coletividade, como no caso de "O time terá um ônibus"? Se os fundadores dos Estados unidos tivessem sido capazes de pensar em termos de uma estrutura quantificacional, poderia não se ter derramado tanto sangue". (p.213)

terça-feira, setembro 27

Armas: a Segunda Emenda

Eis o texto da segunda emenda (EUA), que motiva muita gente a votar no não agora em outubro:
"Amendment II
A well regulated militia, being necessary to the security of a free state, the right of the people to keep and bear arms, shall not be infringed."

"Maior apoio!"

Como era de se esperar (veja post de um mês atrás) o MEC apóia a greve' das Universidades Federais. Tá na página da Universidade, que na verdade é uma transcrição da Folha de São Paulo de hoje. Veja:
"O Ministério da Educação afirmou que ainda negocia com o Ministério do Planejamento e com a Casa Civil uma proposta para apresentar aos grevistas. O texto final deve ser fechado até a próxima sexta-feira. "Consideramos legítimo o movimento, porque eles não tiveram aumento no ano anterior", afirmou o secretário-executivo-adjunto do MEC, Ronaldo Teixeira. A proposta que está sendo debatida entre os ministérios prevê um aumento de 50% no valor dado à titulação do professor (mestrado ou doutorado). Teixeira disse também que o governo pretende negociar tanto a incorporação das gratificações quanto as mudanças nas carreiras."
Bueno, mas essa era a proposta do governo no início da greve', que já foi rejeitada.

O referendo sobre armas

Então tá. Vamos começar com o objeto. No referendo, vamos votar sobre um artigo de lei que diz assim:
“É proibida a comercialização de arma de fogo e munição em todo o território nacional, salvo para as entidades previstas no art. 6º desta Lei” (rol dos agentes que podem portar arma de fogo).
Esse artigo depende de ser referendado pela população para entrar em vigor. Esse é o tema do referendo popular a ser realizado em outubro deste ano.
Se vencer o "sim" o que acontecerá?
• O cidadão comum , que hoje só pode comprar uma arma para mantê-la dentro de casa, ou dentro do local de trabalho (se for o responsável legal pelo estabelecimento ou empresa), não poderá mais comprar arma de fogo ou munição.
• Só estarão legalmente autorizados a possuir uma arma os agentes de defesa nacional, segurança pública, segurança privada e desportistas.
• Quem já tiver arma, não poderá comprar outra, e nem poderá mais comprar munição para a arma que já possui.

segunda-feira, setembro 26

Comércio de armas

Daqui a alguns dias teremos que votar sobre o comércio de armas. Pelo que tenho lido na imprensa, os argumentos que tem sido apresentados podem ser um excelente material para debate sobre ... argumentos e suas fraquezas! Quem sabe a gente faz uma rodada de conversa sobre esse tema?

Links

O blogue teve problemas de desconfiguração. Os links no lado direito desapareceram por algum momento. Espero que tenham voltado. Se o problema persistir, agradeço a informação.

quarta-feira, setembro 21

A falácia de Sócrates


Sócrates, o grande patrono, foi acusado de cometer falácias? Peter Geach faz isso. E diz mais: quando passamos adiante a falácia de Sócrates, podemos causar um prejuizo moral: "I am sure that imbuing a mind with the Socratic fallacy is quite likely to be morally harmful."
Leia mais sobre isso no blogue de Filosofia da Linguagem. O arquivo com as postagens de 36 até 47, daquele blogue, já está disponivel nos Arquivos.

terça-feira, setembro 20

"Vivieron su destino como en un sueño, sin saber quiénes eran o qué eran"


LOS GAUCHOS

Quién les hubiera dicho que sus mayores vinieron por un mar, quién les hubiera dicho lo que son un mar y sus aguas.
Mestizos de la sangre del hombre blanco, lo tuvieron en poco, mestizos de la sangre del hombre rojo, fueron sus enemigos.
Muchos no habrán oído jamás la palabra gaucho, o la habrán oído como una injuria.
Aprendieron los caminos de las estrellas, los hábitos del aire y del pájaro, las profecías de las nubes del Sur y de la luna con un cerco.
Fueron pastores de la hacienda brava, firmes en el caballo del desierto que habían domado esa mañana, enlazadores, marcadores, troperos, hombres de la partida policial, alguna vez matreros; alguno, el escuchado, fue el payador.
Cantaba sin premura, porque el alba tarda en clarear, y no alzaba la voz.
Había peones tigreros; amparado en el poncho el brazo izquierdo, el derecho sumía el cuchillo en el vientre del animal, abalanzado y alto.
El diálogo pausado, el mate y el naipe fueron las formas de su tiempo.
A diferencia de otros campesinos, eran capaces de ironía.
Eran sufridos, castos y pobres. La hospitalidad fue su fiesta.
Alguna noche los perdió el pendenciero alcohol de los sábados.
Morían y mataban con inocencia.
No eran devotos, fuera de alguna oscura superstición, pero la dura vida les enseñó el culto del coraje.
Hombres de la ciudad les fabricaran un dialecto y una poesía de metáforas rústicas.
Ciertamente no fueron aventureros, pero un arreo los llevaba muy lejos y más lejos las guerras.
No dieron a la historia un solo caudillo. Fueron hombres de López, de Ramírez, de Artigas, de Quiroga, de Bustos, de Pedro Campbell, de Rosas, de Urquiza, de aquel Ricardo López Jordán que hizo matar a Urquiza, de Peñaloza y de Saravia.
No murieron por esa cosa abstracta, la patria, sino por un patrón causal, una ira o por la invitación de un peligro.
Su ceniza está perdida en remotas regiones del continente, en repúblicas de cuya historia nada supieron, en campos de batalla, hoy famosos.
Hilario Ascasubi los vio cantando y combatiendo.
Vivieron su destino como en un sueño, sin saber quiénes eran o qué eran.
Tal vez lo mismo nos ocurre a nosotros.

Jorge Luis Borges (In: Elogio de la Sombra)

segunda-feira, setembro 19

Carencia

Uma das mais bonitas passagens do Diário do Dr. Saldanha é quando ele explica para o leitor o que é uma "Carencia":
"Carencia he aquelle sitio, ou lugar, a que estão costumados já por algum tempo, as Boyadas, e Cavalhadas, sendo tal o apego, que tomão os animaes a sua rezidencia que se por acaso podem escapar depois de qualquer numero de Legoas de viagem, cuidadozamente a tornão a procurar".
Não é lindo?

Vaqueanos

Continuando no ritmo, rumo ao vinte de setembro:
Segundo o mesmo Diário Resumido do Dr. José Saldanha, o que é um Vaqueano?
"São os guias, ou Praticos dos Caminhos, atalhos, veredas, conhecedores do terreno dos seus Arroyos, Rios, e nomes. Custa achar-se um bom e verdadeiro Vaqueano, taes são as extensoens desta vasta Campanha."

Gaucho, o vagabundo dos campos

Segundo Braz (Evaldo Munoz Braz, Retratos do Gaúcho Antigo, Martins Livreiro, POA, 2002) "a palavra 'gaúcho' só aparece em crônicas de viajantes na América do Sul por volta de 1770 (...) Quando o nome gaúcho aparece, surge quase simultaneamente nos documentos do Uruguai (1771), Rio Grande do Sul (1777/1787) e Argentina (1812), pois o substrato (changadores, gaudérios, etc, surgidos primariamente) está maduro para resultar no gaucho/gaúcho."
Evaldo Braz (que é santamariense) indica como o primeiro documento no qual consta a palavra gaucho, escrito aqui no Brasil, o Diário Resumido do Dr. José Saldanha, publicado pela primeira vez em 1787. O diário é um resumo do diário geral da equipe portuguesa de demarcação, a mando do tratado de Santo Ildefonso. Saldanha era bacharel em Filosofia, Matemático, especialista também em Geografia e Astronomia.
Dei de mão na minha cópia do Diário, e as menções que encontrei foram essas:
"De hum, e outro lado desse passo, ássaz bom, e digno da passagem de carros, ou carretas, se as vezinhas Coxilhas o permittissem encontramos destroçados ranchinhos e vestigios de Coureadores, e Gauches (*) do Campo."
O asterisco leva a uma nota de rodapé, que diz assim:
"Gauches, palavra Hespanhola uzada neste Paiz para expressar aos Vagabundos, ou ladroens do Campo, quaes Vaqueiros, costumados a matar os Touros chimarroens, a sacar-lhes os Couros, e a levalos occultam-te as Povoaçoens, para a sua venda ou troca por outros generos". (na página 181)
Em outro local:
"... acampamos na sua margem Septentrional, junto a hum passo que de novo se achava feito, e aberto pelos Gauches, ou vagabundos do campo."
Tá no Diário do Saldanha.

Insulamento

No blogue da Filosofia da Linguagem há uma nova série de comentários, centrados no problema do insulamento. Esse tema ainda não é verbete de dicionário de filosofia. A forma como M. F. Burnyeat, em 1984, introduz o tema, no artigo "O cético em seu lugar e tempo" é muito bonita. Veja só:
“Hoje em dia, se um filósofo encontra dificuldade em responder a pergunta filosófica "O que é o tempo?" ou "O tempo é real?", ele pede uma bolsa de pesquisa para trabalhar no problema durante o próximo ano sabático. Ele não supõe que a chegada do próximo ano está de fato em dúvida. Alternativamente, ele pode concordar que qualquer perplexidade acerca da natureza do tempo, ou qualquer argumento para duvidar da realidade do tempo, é de fato uma perplexidade sobre, ou um argumento sobre, a verdade da proposição segundo a qual o próximo ano sabático vai chegar, mas mesmo assim alegar que isso é obviamente uma dificuldade estritamente teórica ou filosófica, não uma dificuldade que deva ser considerada na vida quotidiana. De um ou de outro modo ele insula seus juízos comuns de primeira ordem dos efeitos de seu filosofar.”
Mais, sobre isso, no outro blogue.

domingo, setembro 18

Do baú da didática

- Professora, como se escreve "guêi"?
- Ah, escreve boiola, veado.
- Mas eu quero escrever “fogueira”!

sexta-feira, setembro 16

20 de Setembro? (II)

Está chegando o 20 de Setembro.
O Diário de Santa Maria informa que umas pilchas, das em conta, não saem por menos de 600,00. O jornal esqueceu de fazer um levantamento dos apeiros. Quanto sai um conjunto completo, do xergão até aquele negócio que enlaça o rabo do cavalo? Uma pequena fortuna. Mas botar onde, esses apeiros todos? Quanto sai um tobiano que não nos faça passar vergonha? Mais uns 800,00 ou mil?
Por menos de dois mil contos, um otacilio não desfila.

quinta-feira, setembro 15

O paradoxo da greve

Alguns alunos da USM decidem deixar de ir nas aulas até que as aulas recomecem. Cheira a um paradoxo, que podia ser chamado de paradoxo da greve, um dos tantos. Os alunos estão em aulas, e decidem deixar de ir nas aulas, até que as aulas recomecem.
A proposta parece ser essa. Vamos voltar para a casa, ver as tias e avós, tomar mate na beira do fogão, em Tucunduva, até que os professores se entendam com o ministério da deseducação.
A matéria da Razão de hoje (Thais Miréia, se te copidescaram, me desculpa!) é uma graça. Diz assim: "alguns professores não aderiram à greve". A verdade é exatamente o contrário, na UFSM alguns professores pararam. No CCSH, um dos maiores centros da UFSM, apenas um Curso parou completamente, o de Economia. Não por acaso, é um Departamento que apenas faz graduação, não há Mestrado, Especialização, etc, q.e.d.
A matéria contém uma sutil e brutal inverdade. Nenhum professor que não paralisar é obrigado a recuperar dias letivos no final da greve. Thais, quem foi o bruto que te disse essa mentira? Eu entendo, em todas as greves essa bobagem é repetida pelos de plantão! O calendário letivo está mantido, e tudo o que for feito pelos professores em aula é válido, inclusive a reprovação por frequencia de quem "entrar em greve".
E se o CEPE cancelar o calendário? Aí, pela primeira vez em muitos anos, alguma coisa de diferente vai começar a acontecer nesta mesmice.

quarta-feira, setembro 14

A Filosofia na Feira

Se houvesse justiça no mundo - há alguma, menos do que gostaríamos! - o estande da Filosofia na Feira das Profissões deveria ganhar um prêmio (pois que este ano haverá um prêmio para o melhor estande, etc,). Deixa para lá. O que importa é que os meninos e meninas criaram um estande muito criativo, com duas situações interativas muito boas. Na primeira, eles projetam quadros de Escher, que aparentemente fazem sentido, mas que, considerados com atenção, se mostram absurdos. Ali pode começar uma conversa legal sobre coisas com os limites do sentido, perpectivas, etc. Na outra, eles escrevem perguntas num quadro-branco. Aí chega o curioso, lê as perguntas, escolhe uma e é convidado a escrever umas linhas, para concorrer a um prêmio, parece que é um adesivo bonito, mas poderia ser um livro, um beijo, um cafezinho. Bem, hoje, passei por lá por volta de quatro e meia da tarde, já haviam varios textos, cada um mais interessante do que o outro.
Aqui vai uma mostra das perguntas. Os alunos escolhem a cada dia umas três ou quatro.
• Podemos duvidar de tudo? Quem duvida de tudo, duvida que está duvidando?
• De onde vêm as idéias de bem e de mal? É possível que haja um acordo sobre o que é “bom”?
• Tudo o que é, era para ser? Existe o destino?
• Mentir é sempre errado? Podemos mentir para evitar o sofrimento de alguém?
• Devemos sempre obedecer as leis? Uma lei pode ser injusta?
• A existência de Deus é uma questão de fé pessoal ou pode ser provada?
• Será que temos, de fato, liberdade? Será que somos, de fato, donos de nossos atos?
• Tudo é relativo. A afirmação que “tudo é relativo”, é relativa?
• Quando podemos dizer que começa a vida de um ser humano? “Ser humano” é a mesma coisa que “pessoa”?
• A gente gosta de uma coisa porque é boa (ou bonita, ou agradável) ou a coisa é boa porque a gente gosta dela? Gosto se discute?
Tem mais. Depois eu conto. Um abraço para essa gurizada boa.

Feira das Profissões


Começa hoje, com greve e tudo, a Feira das Profissões. O estande do Curso de Filosofia terá novidades. Uma delas será a projeção de figuras com essa aí, a Queda d'água, de Escher, para ajudar na caracterização do universo de debates da Filosofia. Um desafio e tanto que a meninada da casa, no caso, o Diretório da Filosofia, aceitou levar adiante. Parece que vai ter um café para aquecer as conversas mais demoradas. Boa sorte!

segunda-feira, setembro 12

Me tocou a feia

Não sei quem é o autor, nem sei se a história é mesmo assim, mais invento do que lembro. No baile, ali perto do Passo do Verde (ou seria no Fundo do Formigueiro?), o índio atravessa o salão e tira a moça, bonita, para dançar. Ela faz que não, ele insiste, ela também, que não, mas nem pensar, aceita o convite. A moça é manca. Que fazer, vamos até o fim da marca. O amigo do índio o consola, para mim tocou a feia.

“Fortes, firmes e coesos?”

O Sindicato pergunta se a greve é ainda um instrumento eficiente de pressão ao governo? Aceitei dançar com a feia. Uma saída fácil seria dizer que há uma diferença entre eficácia e eficiência: fazer bem a coisa certa e chegar ao resultado desejado é ser eficaz, fazer certo é ser eficiente. Nessa perspectiva, se poderia dizer que as nossas greves podem ter alguma eficiência mas são pouco eficazes; mas essa terminologia não é boa para um assunto tão complicado.
Entendo a palavra “greve” no sentido de “greve do segmento docente das universidades federais”. Digo isso porque, em abstrato, minha resposta seria simples: sim, greve é um instrumento legal de pressão, etc. Mas a pergunta do Sindicato é feita na conjuntura que estamos vivendo em agosto e setembro de 2005. Outra saída fácil seria dizer que a greve não é eficiente porque não há o que pressionar, porque no momento temos apenas um governo que tenta sobreviver a si mesmo. Esse governo sabe que seu ultimo ponto não é a classe média informada, de quem pouco espera e a quem pouco está disposto a conceder. O governo atual já perdeu o apoio no funcionalismo universitário faz tempo. Sumiram dos carros nos campi os adesivos de Lula e PT que eram milhares. Mas não quero enfatizar tanto essa conjuntura. Tampouco pretendo defender um não irrestrito. Fiz mais de 300 dias de greve. Muitas vezes participei do comando de greve e continuo pensando que a greve é um importante instrumento de pressão. Mais do que isso, as greves das Universidades obtiveram algumas conquistas importantes desde o final dos anos setenta (lá se vão quase trinta anos!) em pleno regime militar.
O que eu posso fazer aqui é oferecer um ponto de vista. A primeira greve nacional das universidades federais foi em 1980 e teve a duração de 26 dias. Ali havia um sentimento de que a nossa greve era parecida, em algum sentido, àquelas feitas pelos metalúrgicos, por exemplo. De 80 até 85 houve greve em todos os anos, exceto em 83. De 86 em diante tivemos um ritmo parecido, num ciclo de duas greves pequenas (30 dias) para uma greve grande (dois meses ou mais). A partir de 95 o padrão se alterou, com o fim das greves curtas (a maior, se lembro bem, foi a de 98, que durou 104 dias). Se eu chamo a atenção para isso é para se fazer um comparativo com o movimento grevista dos demais setores da sociedade civil brasileira, em especial de operários como os metalúrgicos do ABC. E a conclusão é que não há um padrão remotamente parecido de greves. Os antigos companheiros entraram em outro ritmo. E nós, de 1978 até hoje acumulamos mais de 1000 dias sem aulas. Greve, para eles, significa outra coisa, com outro peso e preço. Com o fim da parceria, terminou também um certo idílio com a opinião pública, que era benevolente conosco no inicio. Uma prova disso foi a passeata em 1984, com mais de dois mil professores, funcionários e estudantes desfilando nas ruas da cidade, desde o prédio de apoio do CCSH na Floriano até a Câmara de Vereadores. Hoje, uma passeata assim é impossível.
Havia pressão e conquistas nas greves? Sim, vezes mais e vezes menos. Mas haviam algumas regras e pressuposições. Uma regra de ouro era que uma greve precisava ser “forte, firme e coesa”; ninguém entrava sozinho, ninguém saía por conta; somente se entrava em greve com a maioria de universidades tendo votado a favor, em data unificada, e sempre com a participação de um bom número de “grandes”. Isso começou a ser questionado, com o tempo, quando predominou a voz de “greve no bojo”. “Greve no bojo” queria dizer greve conjunta de todo o funcionalismo publico. Levou um bom tempo para que a turma da “especificidade” voltasse a ter voz: a greve tinha que ser somente das universidades; a especificidade, por sua vez foi radicalizada e passamos a ter uma greve de cada segmento dentro das universidades, com agendas e calendários separados. Uma suposição era que nossas greves eram da mesma família da greve de operários; com o tempo, essa comparação não mais podia ser feita; nenhum operário faz greve durante três meses, recebendo o salário e parando seletivamente apenas os setores que quer parar. O complexo sistema de pós-graduação e pesquisa que foi sendo instalado progressivamente nas universidades não permitia – e cada vez permite menos- que as portas da mesma sejam fechadas como as de uma fábrica. Nossas greves eram de outra espécie, e progressivamente assumiram uma identidade muito peculiar, mais próxima à de movimentos de protesto, baseados na solidariedade um tanto forçada dos estudantes de graduação.
Há quem diga que “se não fossem as greves, não haveriam tais e tais conquistas”. Pode ser; mas pode não ser, pois esse raciocínio é um condicional contrafático; isto é, um outro curso de acontecimento não ocorreu e ficamos discutindo hipóteses contra os fatos. É bem possível que os governos tenham, de uns anos para cá, passado a fazer a política salarial das universidades contando com a eclosão desses protestos. Assim, a relação de causa e efeito ficaria invertida, pois o governo esperaria a greve para oferecer as migalhas do ano.
Este ano temos novamente uma greve com entrada a conta-gotas, pela beirada do pires: Acre, Amapá, Rondônia, etc. Novamente, mandamos a gurizada para casa, mais por conta do RU e tocamos a pesquisa. (A gente prova a dissociabilidade do ensino e da pesquisa na prática). Novamente, a estratégia é a do “arranque nacional”: a greve pega no tranco, nem forte, nem firme, nem coesa, pelas beiradas do Brasil, pelas beiradas de cada universidade.
Há quem dance com a feia. Há quem dance com a manca. Eu acho que a maioria dos professores apóia a greve como um instrumento de pressão ao governo. Mas acho também que essa mesma maioria sente um enorme desconforto quando faz o balanço dos ganhos e desgastes que elas tem gerado nos últimos anos; essa mesma maioria, eu acredito, gostaria que ao menos uma vez a greve voltasse a ser forte, firme e coesa, nem que para isso tivéssemos que esperar mais alguns anos, que nos curassem da tentação de pensar que quem é contra a greve (na forma como tem ocorrido) é individualista e a favor desses governos “que estão aí”: a lógica das greves não é assim tão ilógica.

Forte, firme, coesa.

O titulo do artigo é uma madeleine, um mantra que o Pistóia e eu recitávamos, para manter o bom humor diante de uma peça literária que existia nas greves dos anos oitenta, a "avaliação de conjuntura", que costumava terminar com esse mantra: "a greve continua, forte, firme, coesa". Podíamos estar caindo pelas beiradas, mas o mantra era esse!

Greve (4)

Acho que vou voltar aos poucos a esse assunto, que tem mais espinhos que cabo de rosa. Escrevi o artigo para o jornal do sindicato, fiquei parcialmente satisfeito com o resultado. Digo parcialmente porque me dei conta que, por mais que tenha tentando pensar sobre isso, sempre tem mais e mais coisas em jogo, e a conversa parece ser interminável. Me dei conta que alguns argumentos que costumo usar somente fazem sentido para gente mais usada, como eu. Fiz uma comparação com a greve dos metalurgicos para dizer que nos anos oitenta a gente se sentia um tanto próximos, nas greves, e depois me dei conta que isso talvez não faça nenhum sentido para os grevistas de hoje, que simplesmente vão dizer que cada um tem seu cada qual, cada macaco no seu galho, nada de comparar alhos e baralhos. Pois é, nada como brincar com joguinhos semióticos de significante e significado, mas o que fazer? Pensando nas coisas especulativas e antigas que escrevi, que mereceram a crítica atenta do Adriano, vou postar o artigo sobre a greve.

Se um dia tivemos tudo, coxilhas infinitas, a moldura do céu profundo, hoje, restam de horizontes um quase nada de mundo, e o mundo 'é o nosso mundo'.

A frase acima é do manifesto de criação do Instituto Cultural José Gervasio Artigas. Os autores do manifesto seguem o texto: O Instituto "adota este nome inspirado no grande líder oriental, talvez o maior que a América conheceu, ainda que o tenha sido por pouco tempo – suas idéias, seus índios, seus gauchos, sua legenda, sua obra, sobretudo, espicaçada, minimizada por artifícios colonialistas, por interesses bastante claros de Portugal, Espanha e Inglaterra, por supuesto, com respeito (sem nenhum respeito!) a esta região."
E seguem, falando agora sobre uma das iniciativas do Instituto, uma revista, a Tudinha:
"Chamar-se-á Tudinha. Existe nome mais lindo? Digam-no no escuro, um sussurro que seja, audível somente pela nossa inteligência, sem a intermediação de Deus ou dos ouvidos. Não é lindo?... Pois é. Tudinha é uma das ricas personagens de Simões Lopes Neto, um dos maiores escritores da língua portuguesa, não por acaso, da Metade Sul do Rio Grande do Sul, de Pelotas, terra do charque e de Vítor Ramil.
Sim, mas por que Tudinha e não Jango Jorge ou Reduzo?
Primeiro, por ser feminina. Em terra de machismo exacerbado, nada mais oportuno do que engravidar de uma revista e passar a gestação inteira torcendo para que vingasse fêmea, tricotando múltiplas cores. Depois, pelo que o vocábulo significa, diminutivo feminino de “tudo”, um paradoxo em si mesmo, e auto-ironia que nós, que temos “o resto do mundo em volta”, nos permitimos, magnânimos. E, claro, pela ação da personagem no conto O negro Bonifácio. Leram?... Viram o que ela faz?!..."
O manifesto é coisa mais linda. Leiam o resto no www.lapandorga.com.br!

Sobre a greve, etc.

O blogue ficou parado no final de semana, mas eu não. Escrevi o artigo para o jornal da Sedufsm, sobre a greve, e mais um para a Tudinha. O artigo para a Tudinha eu vou deixar inédito aqui no blog. Se você não sabe o que é a Tudinha, paciência. Depois eu explico. Mas o artigo sobre a greve eu vou postar depois.
E se foi o terceiro Tratado Ontológico das Bolas do Boi que havia na Cesma! Já se pode encomendar mais um lote. As tratativas para um lançamento local na Cesma vão indo bem.

sábado, setembro 10

Bloch

O Texto a seguir é de Suzana Albornoz, de longe a maior conhecedora do pensamento de Ernst Bloch no Brasil.

"Humanista e socialista, pois, durante a primeira guerra mundial, Bloch se recusou a lutar, exilando-se na Suíça. Casou-se pela primeira vez com Else von Stritsky, russa de origem aristocrática,de profundas convicções religiosas. Else morreu precocementeem 1921. Em sua única obra até hoje traduzida para o português – Thomas Müntzer, teólogo da revolução -, o filósofo mostra seu entusiasmo com o misticismo cristão, tão forte na Rússia,e com os novos caminhos sociais e políticos de dimensão messiânica trilhados pelo povo russo naqueles anos da Revolução de 1917, sendo estes elementos aliados a um pathos doloroso,que expressa, de algum modo, o luto recente.
Após a República de Weimar e com o advento do nazismo na Alemanha,em 1933, começa longo período de exílio – em Zürich, Viena, Praga e, finalmente, em 1938, nos EEUU, onde Karola Bloch, de formação arquiteta, providenciaria o sustento da família.
Terminada a segunda guerra mundial, em 1949, Bloch pôde escolher entre a Universidade de Frankfurt, na Alemanha ocidental, e aUniversidade Karl Marx, em Leipzig, na zona oriental, tendo optado por esta, coerente com seus ideais socialistas.
Todavia, suas idéias eram demasiado livres e originais, idealistas para o gosto da ortodoxia do partido comunista da então DDR e, após a repressão da rebelião da Hungria, em 1956, quando se manifestou solidário com o povo húngaro e contra a intervenção autoritária, o filósofo e seus discípulos passaram a ser vigiados, impedidos de falar e perseguidos, por isto, em 1961, por ocasião de uma licença para visitar amigos na Alemanha ocidental, a família Bloch não retornou a Leipzig, iniciando-se o período de Tübingen, na Suávia, sul da Alemanha ocidental."
Leia mais em:
http://www.celpcyro.org.br/AFELICIDADEPROMETIDA.htm

Esperança


Uma novidade editorial importante está na rua. Saiu o primeiro volume da trilogia de Ernst Bloch, em primeira tradução para a língua portuguesa, "O Princípio Esperança". A hora não podia ser melhor. Os dois outros volumes serão publicados nos próximos meses. A Editora chama-se Contraponto.
Outro livrão que ganha as livrarias é "O Mundo Como Vontade e Representação", de Schopenhauer. Ainda não havia uma tradução para a língua portuguesa da edição completa. Saiu pela UNESP. Vamos encomendar para ter ali na CESMA, para o dia da inauguração, que está cada vez mais perto. Dizem os bem informados que a casa está preparando muitas surpresas. O Gilmar chegou a dizer que é para reservar uns trocos, pois vai ter novidade de montão.

quinta-feira, setembro 8

A filosofia e seu ensino

A Editora da Unijuí deve publicar em breve um texto, organizado pelo Prof. João Crisóstomo, com algumas idéias do Prof. Tugendhat sobre ensino de filosofia. Conversei sobre esse tema com ele, no final de semana. Os alunos mais antigos talvez lembrem que fizemos uma discussão com ele, na sala 1217, faz uns quatro anos.
A idade traz junto consigo, às vezes, sabedoria.
Ele contou sobre alegrias e decepcões no ensino de filosofia. Uma tentativa que fez foi a adoção do modelo oxfordiano de ensino de filosofia: poucas aulas, um ensaio por semana, avaliação rigorosa da capacidade do aluno em expor suas idéias.

quarta-feira, setembro 7

Gatos (II)

Érebos, informa o tradutor de Baudelaire, é uma entidade preexistente à criação do universo. O dito é filho de Caos e irmão de Nyx (a Noite), símbolo literário da morte.

Gatos

OS GATOS

Os amantes febris e os sábios solitários
Amam de modo igual, na idade da razão,
Os doces e orgulhosos gatos da mansão,
Que como eles têm frio e cismam sedentários.

Amigos da volúpia e devotos da ciência,
Buscam eles o horror da treva e dos mistérios;
Tomara-os Érebro por seus corcéis funéreos,
Se a submissão pudera opor-lhes à insolência.

Sonhando eles assumem a nobre atitude
Da esfinge que no além se funde à infinitude,
Como ao sabor de um sonho que jamais termina;

Os rins em mágicas fagulhas se distendem,
E partículas de ouro, como areia fina,
Suas graves pupilas vagamente acendem.

Charles Baudelaire – As Flores do Mal

terça-feira, setembro 6

Rorty, Levi-Strauss e um terceiro


Em 2001, a "Düsseldorf Identity Foundation" instituiu um prêmio, chamado "Meister Eckhart", destinado a reconhecer os pensadores que tem produzido trabalhos de alta qualidade sobre o tema da identidade. Em 2001, o ganhador foi Richard Rorty, professor de filosofia e literatura comparativa em Princepton, Virginia e Stanford, e figura de proa na filosofia contemporânea. O segundo ganhador foi ninguém menos do que Claude Lévi-Strauss, em 2003. O prêmio, concedido a cada dois anos, vem acompanhado de um cheque de 50.000 euros, e o ganhador é escolhido por um juri de nomes internacionais, nos seguintes campos de investigação: filosofia, teologia, história, sociologia, ciência política, antropologia, etnologia, linguística e psicologia. Um dos critérios para o prêmio é a inclusão de uma abordagem interdisciplinar e a apresentação de idéias acessíveis ao publico leitor em geral.
Em 2005, o prêmio Meister Eckhart já tem o terceiro ganhador, que esteve, dias atrás, em nossa cidade.
Tugendhat nos contou que antes de vir para o Brasil, recebeu um telefonema no qual alguém dizia ter uma "feliz notícia" para ele. Ele achou que era uma dessas pegadinhas de telemarketing e quase desligou o telefone na hora. A pessoa insistiu e perguntou se ele aceitaria receber, em Dezembro, o Prêmio Meister Eckhart.
Ele contou isso, na noitinha do sábado, aquecendo as mãos numa chícara de chá de laranja, e fazendo uma expressão típica de quem lembra de uma pequena alegria que gostaria de repartir com amigos.

segunda-feira, setembro 5

Greve: MEC se move?

O MEC enviou na tarde de hoje o seguinte documento aos integrantes do GT-MEC:

Dando prosseguimento ao processo negocial em curso entre o Ministério da Educação e as
entidades representativas dos docentes das Instituições Federais de Ensino Superior, e conforme o
acordado na última reunião do Grupo de Trabalho, realizada no dia 31/8/2005, vimos ratificar propostas
anteriormente discutidas:
1. Aumento de 50% dos atuais percentuais de titulação, a partir de janeiro de 2006;
2. Estabelecimento de um cronograma de incorporação da Gratificação de Atividade Executiva - GAE;
3. Transformação do atual GT em GT-Carreira que irá elaborar proposta de reestruturação da carreira
do magistério superior que contemple, dentre outros, a criação da classe de professor associado.
Compreendendo que estas propostas alcançam parte representativa das reivindicações da
categoria, reiteramos a importância do diálogo, etc..."

Texto da palestra do Prof. Tugendhat

Algumas pessoas que estavam hoje pela manhã na palestra do Prof. Tugendhat perguntaram por uma cópia do texto. Infelizmente, ele viajava logo depois do almoço para Ijuí e não foi possível ficar com uma cópia. A boa notícia é que a PUC de Porto Alegre deve publicar - a informação foi dada pelo próprio conferencista - na semana que vem um pequeno volume com o texto das três conferências, sob o título de "O problema da liberdade da vontade e outros ensaios". Assim que souber mais sobre isso, informo.

quinta-feira, setembro 1

Greve (3)

Fiz uma primeira tentativa de escrever sobre a greve, revisando um escrito antigo sobre greves, de 2000, mas está muito especulativo, e publiquei no blogue de Prática em Filosofia.

Greve' (2). Lá se vai meu xale outra vez!

- Não posso acreditar nisso! disse Alice.
- Não pode? - disse a Rainha com tom de voz penalizado.
- Tente outra vez: respire profundamente e feche os olhos.
Alice riu.
- Não adianta fazer isso - disse ela - ninguém pode acreditar em coisas impossíveis.
- Eu diria que você nunca praticou bastante - disse a Rainha. Quando eu tinha a sua idade, praticava sempre meia hora por dia. Às vezes me acontecia acreditar em seis coisas impossíveis antes do café da manhã. Lá se vai meu xale outra vez!

O trecho acima, de Lewis Carroll, como se vê, me veio ao espírito, quando lembrei que aceitei (eu me odeio?) o seguinte convite do sindicato dos professores:

"Prof. R.
Estou contando com a sua colaboração para escrever um artigo ao Jornal da SEDUFSM (seção Ponto & Contraponto) respondendo a seguinte pergunta:
"A greve ainda é um instrumento eficiente de pressão ao governo?"
O seu artigo seria abordando o "Não", ou seja, argumentando contra a eficiência da greve.
Acho que o debate é bastante interessante. Teria que ser abordado num tamanho entre 60 e 70 linhas.
Prazo para entrega: quinta, 8 de setembro ou, no máximo, segunda, 12 de setembro."

Help!

Greve'

Greve' por tempo determinado na Universidade, a partir da segunda-feira, dia 5, até o dia 7 de novembro.

Tugendhat: uma correção

O tema da palestra do Prof. Tugendhat será "O problema da liberdade da vontade", e não mais "O nosso temor da morte". Os demais dados não se alteram: segunda, dia 5, às 10,00 horas, no Anfiteatro Pércio Reis, no prédio da Engenharia.

Severino e Descartes

Está na Folha de São Paulo de hoje:
"No dia seguinte a troca de ofensas na Câmara dos Deputados, o presidente Severino Cavalcanti (PP-PE) tratou do assunto com ironia, classificando o bate-boca de "excelente". Apesar disso, Severino admitiu, em conversas reservadas, que se excedeu e que foi "inoportuna" sua entrevista à Folha publicada na terça-feira, quando defendeu penas mais brandas para deputados que usaram caixa dois.
"[Foi] Excelente. Eu tenho que ser questionado, porque, sendo questionado, é uma prova de que eu estou vivo", afirmou."
Como diria Gabeira, "o que é isso, Severino? Um desastre..."

quarta-feira, agosto 31

Explica, mas não justifica

A decisão do sindicato dos professores municipais de Santa Maria, de não levar os alunos para o desfile de sete de Setembro me fez lembrar uma frase que meu pai usava, de vez em quando. Ele deve ter aprendido ela com o meu avô, que deve ter aprendido com meu bisavô e assim por diante. A frase é essa: “explica, mas não justifica”. A gente usa essa frase quando escuta alguma explicação que mais parece uma desculpa. Por exemplo, alguém faz alguma coisa que, em algum sentido pode ser polêmica, discutível ou mesmo condenável, mas mesmo assim a pessoa acha que pode explicar o que fez. Ou seria melhor dizer que a pessoa acha que pode justificar o que fez? Alguns políticos do PT, por exemplo, dizem que todo mundo fazia caixa dois, porque as campanhas são caras e as leis não são boas, etc, e se todo mundo faz, nós somos mundo também, etc. Aí vem o ditado: até explica (a carne é fraca, etc.) mas não justifica.
Os professores municipais estão com raiva do prefeito, do secretário, porque não tiveram aumento nenhum; e uma pessoa com raiva normalmente faz coisas para desabafar ou descontar a raiva, e essas coisas podem ser debitadas na conta da raiva, mas nem sempre se justificam. Por exemplo, quando eu dava uma porrada no meu irmão menor, meu pai primeiro me perguntava porque eu tinha batido nele. Aí eu dizia que tinha batido nele porque ele tinha me xingado. Aí meu pai dizia, “explica, mas não justifica”. Explica, porque se xingam a gente, a gente fica com raiva, etc. Mas não justifica, isto é, uma pessoa maior não deve se aproveitar de seu tamanho e força para descer o braço no baixinho. Fazer isso era covardia (“Tamanho homem batendo num pequenininho!”) mesmo que a raiva fosse grande. Eu podia ter motivos para bater, mas não tinha razão; ter motivos é uma coisa psicológica e pessoal: ter razão é uma coisa objetiva, pública, argumentável.
Os professores tem todos os motivos do mundo para protestar contra o governo municipal. Mas a festa é federal, mais do que federal, a festa é da pátria. E ninguém tem razão quando se trata de privar os alunos de sua semana da pátria. A gente até entende a explicação do sindicato. Eles explicam, mas não justificam. E desde quando se coloca criança no meio da briga de gente grande?

A pontuação da morte

Reparto com os leitores do blogue um poema de Antonio Augusto Ferreira, dos melhores de sua obra. Acho que minha simpatia para com esse texto não se restringe à beleza literária do mesmo, é uma questão de turma. Leia e veja qual é a tua turma. Lembrei do texto até pela proximidade da palestra de segunda-feira, do Prof. Tugendhat.


A PONTUAÇÃO DA MORTE

Leia-se bem a MORTE:
morte, vírgula ou morte, ponto.
Atente-se à pontuação:
depois da vírgula, segue
mas depois do ponto, não.

Para os da vírgula
é preciso crença.
O ponto, não,
o ponto dispensa.

Há quem pontue a morte
com uma interrogação,
estes, estão no escuro.
Há também os reticentes...
morte em cima do muro.

E eu, afinal?
depois da morte,
ponto final.

Antonio Augusto Ferreira
19.12.01

Palestra do Prof. Tugendhat em Santa Maria

Está confirmado. Dia 5, segunda-feira próxima, o Prof. Ernst Tugendhat estará em Santa Maria, para dar uma palestra. O local é o Auditório Pércio Reis, no prédio da Engenharia, no Campus da UFSM, às 10.00 horas. O título da palestra é "O nosso temor da morte". O Prof. Tugendhat dispensa apresentações. Trata-se de uma oportunidade imperdível de conhecer um dos maiores filósofos da atualidade. A palestra será em português.

terça-feira, agosto 30

20 de Setembro?

Empresto o blogue para um texto de Russel Vaz Moraes, visitante quem vem das bandas do Alegrete. Russel é professor de Língua Portuguesa e Literatura em Alegrete (também conhecida por uns poucos como Nova Hereforde! O blogue está ficando intermunicipal, como se pode ver!) Com a palavra o Russel:

Quase de arrasto, mas gaúcho

Na vida, há coisas que precisam ser ditas. Coisas que todo mundo sabe, todo mundo vê. Coisas que, porém, poucos ousam a dizer, a difundir, pois, ao propalá-las, pode-se, como escrevera Thiago de Mello, em "Canção para os fonemas da alegria", despertar "o bicho de quatrocentos anos", cujo "fel, espesso", pode gerar abalos sísmicos mesmo em geografias praticamente inertes, a exemplo desta em que vivemos.
Pois, mesmo assim, para propagar o que muitos afirmam ser "indizível", José Carlos Queiroga está de volta. E mais incisivo, como se esperava. Ora presente, ora retroativo, "Tratado Ontológico acerca das Bolas do Boi", lançado em outubro de 2004, pela Editora Méritos, meche na ferida e deixa à mostra o pus que, há tempos, vem, qual tsunami, sobrepondo-se ao verde campestre. O pus que vem arrasando vidas e deixando a la suerte milhares de Otacílios, cotidianamente abocanhados (e esgualepados) por estes imensos cinturões de miséria, com os quais já se deparavam, entre outros, o Chiru e o João Guedes, na profética trilogia do gaúcho a pé, de Cyro Martins.
Depois de "Viagem aos Mares do Sul" (Mercado Aberto, 1999), o jornalista discute, com maior ênfase, a questão do latifúndio, analisando suas origens arcaicas e seus desdobramentos presentes. Em quinhentas e vinte e quatro páginas, o calvário de Otacílio, em busca de um cavalo para desfilar no dia 20 de setembro, decantada como "data magna da identidade pampeana", é um fiel retrato do momento por que passa o gaúcho, expurgado da lidas, pós-a-pé, quase de arrasto, perambulando pelas sangrias da vida, bebendo canha e virando o mate, cuspindo de laçaço, sem eira nem beira, debatendo o preço da arroba bovina e da saca do arroz alheio.
Segundo o professor e crítico literário Marcelo Backes, o "Tratado de Queiroga é um romance-tese (...). E o autor é conseqüente, crítico, materialista, dialético, tem noção profunda do mundo que o rodeia. Ele vê e assimila tudo (...)." Tanto é verdade que um tal Movimento Sepé Tiarajú surge, no front de sua literatura, para protagonizar um incessante duelo com o Grunhe (Grêmio Ruralista de Nova Hereford), que serpenteia o referido grupo de infelizes - grupo que derrete sob lonas de cor funesta, cor de carvão, assim como o carvão que, logo em brasas, assa a picanha e a costela de primeira que, somadas a inevitáveis tragos, abastecem a vigília, à margem do acampamento.
E eis que surge Galdino, paladino, personagem que defende a tese (catequese, por supuesto, of course), levanta literalmente a bandeira (vermelha), mateando com Tunica: Otacílio, como outros tantos, milhares, é uma "vítima" – vítima, na verdade, de uma circunstância alheia à sua vontade de analfabeto, como no "tempo dos farrapos". A ignorância (em seu ponto mais íntimo), assim, alimenta a idolatria. No ar, paira Marx: o peão endeusa o patrão, que, com isso, alicerça suas cercas de pedras. Galdino, claro, rechaça qualquer aproximação e quer o confronto – direto, se for preciso. E a luta continua, companheiro!
De fundamental leitura, em busca de necessárias interpretações, "Tratado Ontológico acerca das Bolas do Boi" surge como "o outro lado da moeda": a visão abnegada em relação a interesses minúsculos, que contemplam parcelas cada vez menores de uma sociedade prestes a ser coberta por uma erva daninha que se chama ganância.

Russel Vaz Moraes
russelvazmoraes@gmail.com)

segunda-feira, agosto 29

Ser e ser percebido

Ao menos um filósofo, se vivo fosse, ficaria honrado em defender seu ponto de vista diante das perguntas levantadas por Cornélia. O Bispo Berkeley (um irlandês que viveu entre 1685 e 1734) dizia que "ser é ser percebido". Ele dizia que existem apenas duas coisas: as idéias, que são objetos de nossa consciência, e a nossa consciência. Mas e o mundo, você perguntará, como fica? O mundo, como dirá mais tarde um outro filósofo, é nossa idéia.
Berkeley tratou do tema no livro chamado "Três Diálogos entre Hilas e Filonous", no qual suas idéias aparecem nas falas de Filonous. Acho que valeria a pena tentar expor o espírito dessas idéias para Cornélia.
E os números, hein, que bicho estranho é o tal do número?
E pensar que tanto faz a gente saber ou não saber (se é que alguém sabe...) o que é "número" para levar pau na matemática.

O Seu Descartes

Passo a palavra para a leitora Cornélia, 11 anos. Transcrevo um trecho de sua carta:
"Sabe, assisti o fantástico e as minhas perguntas não são filosóficas mas cornelióficas: queria saber se os filósofos entendem o que é dito lá? Sabe se para o tal do DeKarte, não sei se escreve é assim , só existe o que se pensa. Então a casa não existe? Pensando na Emília no país da matemática: então o 2+2 existe, mas eu penso casa não como penso os números. Uma casa é para se morar e elas existem para a gente morar e os números existem para quê? E se são a unica certeza como é que pode? A gente não come número, a gente não planta número, a gente não acha número, é um desenho, ou pior que desenho,porque o desenho é uma coisa que está no mundo que as pessoas colocam dentro delas e depois vai para a ponta do lápis e o número? Sabe, na Olimpíada Matemática só tive 6 acertos, tenho a impressão que tem uma rebelião dos números querendo dominar o mundo e parece que o tal do Dekarte tem culpa disso."

sexta-feira, agosto 26

Zorro e Tonto

Retomando o assunto: Zorro e seu fiel escudeiro, o indio Tonto, estavam pocotó, pocotó, etc, quando hostis hordas de hediondos indios os cercaram, por razões que o roteirista mal esclareceu, o desleixado. A hostil tribo (close na indiada) deixa bem claro a intenção de fazer a cabeça dos invasores (sacodem lanças, agitam as rédeas dos matungos, gritam ulalá, coisas assim). Corte para Zorro, que olha para Tonto e diz qualquer coisa como : "Acho nós estamos, digamos, mal na fotografia!" (Tem criança que lê o blog, respeito!) Tonto, que de tonto nada tinha, puxando o cavalinho dele para trás e já entortando a rédea em direção às ordas, responde ao Zorro: "Nós quem, cara-pálida?".
Reconheço que a história é batida do que a cara do Maguila, mas não deixo de pensar nela quando vejo gente triste com a história do PT, pensando que com essa crise toda do governo ficam mal as idéias normalmente anotadas na caderneta da esquerda. Os pensamentos e as ações dirigidas contra a injustiça, a miséria, a opressão nunca dependeram desse ou daquele partido. Esses pensamentos e essas ações foram criadas pelos homens desde que ficou claro que a matéria-prima do vivente humano não é flor de cheiro, que no menor descuido sempre tem uns poucos prontos para ferrarem os demais. Teve "esquerda" desde os tempos mais antigos, e ela incluiu todos os que ergueram voz e braço contra esses sofrimentos descabidos, desde Buda e Cristo.
Vão-se os partidos, ficamos nós, os insetos menores, fazendo nosso trabalho.
A esquerda está em crise? Qual esquerda, cara-pálida?
Bem fez quem leu Castoriadis, desde 1979 (o primeiro texto do careca saiu no Brasil pela PLM em 79). Muitos dos que o descobriram a partir de 85 chegaram tarde demais, o que mais queriam era dar uma aparelhadinha no careca, entrou por uma orelha e saiu pela outra!
O que eu queria mesmo era escrever sobre a seguinte pergunta: o que tem a ver a perda das utopias com a crise das esquerdas? A minha respostas é impublicável, mesmo nesse blog. Ela se assemelha à resposta que damos para a seguinte pergunta: o que tem a ver as nádegas com as calças? Como se sabe, a resposta popular é que a relação entre ambas é totalmente contingente.
O assunto é longo, no entanto, fica para outro dia.
Diabo, ninguém mais comenta nada?

Do Alegrete


Do Alegrete, no meio da tarde, recebo um chasque de José Queiroga, que os leitores deste blog já sabem quem é, o homem das bolas do boi, do tratado ontológico. Até refiz o laço ali no lado para quem não lembra. O logotipo acima é de uma ONG que está sendo lançada no Alegrete, cujo manifesto acabo de ler e que dá um nó no coração da gente, de tão bonito. Vou copiar uns trechos depois aqui no blog. Eu já tapei o índio de elogio aqui no blog, pois o homem tem o texto mais agudo e criativo que já li na tradição do Cyro Martins e demais. O Otacílio do homem é descendente direto do Chiru do Cyro, comendo o pó das Mitsubicho. Queiroga é bom demais, e agora vai atacar de ONG, com revista e coleção de livros.
Mas eu só conto o resto depois que alguém levar o exemplar do "Tratado Ontológico..." que está ali na mesa de exposição da
Cesma. Compra que eu garanto!
Prá gente poder trazer mais.