"O que é isso, a filosofia?"
Adriano e Sílvia visitam o blog, e pela condição de leitores do Moranafilosofia dos anos 90, furam a fila das postagens que quero comentar aqui. Começo pelo Adriano. A citação do Cavell, sobre o que é filosofia, é essa:
"Eu compreendo (a filosofia) como um desejo de pensar, não sobre coisas diferentes daquelas sobre as quais as pessoas comuns pensam, mas ao contrário, de aprender a pensar de forma não distraída sobre coisas que os seres humanos comuns não podem deixar de pensar, ou, enfim, sobre coisas que não deixam de ocorrer a eles, algumas vezes em fantasias, algumas vezes como que num relance por entre uma paisagem; são coisas tais como, por exemplo, se podemos conhecer o mundo como ele é em si mesmo, ou se outras pessoas realmente conhecem a natureza das nossas experiências, ou se o bem e o mal são relativos, ou se poderíamos agora estar sonhando que estamos acordados, ou se as modernas tiranias e armas e espaços e velocidades e artes estão em continuidade com o passado da raça humana ou são discontínuas, e assim se o aprendizado da raça humana não é irrelevante diante dos problemas que criou para si mesmo. Tais pensamentos são exemplos daquele desejo característico da humanidade de fazer para si mesmo perguntas que não pode responder satisfatoriamente. Os cínicos acerca da filosofia, e talvez acerca da humanidade, opinarão que perguntas sem respostas são vazias; os dogmáticos pretenderão ter respondido a tais perguntas; os filósofos que admiro preferirão sugerir o pensamento que ao mesmo tempo que pode não haver respostas satisfatórias para tais questões em certas formas, existem, por assim dizer, direções para respostas, maneiras de pensar, que valem o tempo de nossa vida aplicado em descobri-las.
Esse texto de Stanley Cavell está no livro Themes Out of School. Effects and Causes. (The Thought of Movies). The University Of Chicago Press. 1988, p. 9.
A tradução, que precisa ser revista, é minha. O contexto da passagem é uma discussão sobre filosofia e cinema.
Quanto à diferença entre "filosofia profissional" e a filosofia que a gente faz como indicado no texto acima, creio é de grau, e não de natureza. Esse professor de Introdução lembrado pelo Adriano talvez queria dizer algo como "filmes de Hollywood não são apenas objetos comerciais" (quem não se comoveu com "Menina de Ouro"? E desde quando minhas lágrimas são apenas objetos de mercado?) e, assim, Filosofia Profissional existe, mas é apenas uma parte da filosofia, a parte menos interessante, diante do que diz Cavell. Sei não, a diferença parece ser mesmo de grau. O que esse professor queria dizer?
4 comentários:
O volume 28, número 1 da revista Trans/formação traz um artigo sobre ensino de filosofia (!) no qual é citada a seguinte afirmação de Gérard Lebrun: "Nunca acreditei que um estudante pudesse orientar-se para a filosofia porque tivesse sede de verdade: a fórmula é vazia. É de outra coisa que o jovem tem necessidade: falar uma LÍNGUA DA SEGURANÇA [minha ênfase]; instalar-se num vocabulário que se ajuste ao máximo às dificuldades (no sentido cartesiano); munir-se de um repertório de topoi - em suma, possuir uma retórica que lhe permitirá a todo instante denunciar a 'ingenuidade' do 'cientista' ou a 'ideologia' de quem não pensa como ele. Qual melhor recurso se lhe apresenta senão tomar emprestado um discurso filosófico?" Se interpreto bem as nossas conversas recentes sobre a filosofia - seu lugar e seu papel na vida das pessoas e da sociedade - você concorda com alguns trechos desta citação e discorda de outros, não é mesmo?
Na mosca. Bela passagem. De fato Lebrun apanha um certo traço da busca de filosofia pelo jovem, mas há um pouco de reducionismo no que diz. Obrigadíssimo pela dica.
Anônimo 30 do 4
Frank, que "linguagem" deverá prestar socorro quando - naturalmente - o discurso filosófico titubeia?
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