quarta-feira, julho 20

Ernildo Stein, lembro bem.

A ética, depois do milhão.
Esse foi o tema, acho que numa janta no Barranco, na descida da Protásio, em POA, com alguns filósofos importantes de Sampaulo. Ernildo, naquela época, ainda era cassado, e estava fora do sistema universitário, trabalhando com o Lanificio Albornoz em Livramento. Não me lembro bem, mas a conversa enveredou para a relação entre comportamento ético e dinheiro. Conversa vai, conversa vem, Ernildo saiu-se com a frase que não esqueço:
"Depois do milhão de dólares, essa ética que a gente acredita no dia a dia não faz sentido."
Eu não estou seguro que ele tenha dito exatamente isso, a idéia era essa.
A frase me marcou muito, talvez por me proporcionar uma oportunidade de me dar conta de minha ingenuidade, apesar de já ter vinte e muitos anos, na ocasião: havia um mundo do qual eu não fazia a menor idéia, onde o que nós, comuns mortais, achamos certo ou errado, é apenas risível.
Hoje, em diversos momento do dia, acompanhei o depoimento do Delúvio.
Acabou.
O diabo é que precisamos lembrar de pessoas como a Soninha.
Ou, para dar um exemplo local, eu diria, do Werner.
Ou do Marcos Rolim.
Eu seguiria a lista, tem muita gente boa no PT.
Eu só tenho medo de quem tem patrimonio pessoal na marca do milhão.
Aí eu começo a me lembrar da frase do Stein.
No meio do delúvio.

Um comentário:

Anônimo disse...

Pois é, tem muita gente boa no PT e devemos lembrar deles. Entretanto, não devemos lembrar que também existem pessoas boas em outros partidos? A megalomania petista ensinou muita gente a pensar que não houvesse lugar pra pessoas boas no PFL do Antônio Carlos Magalhães, no PMDB do Sarney e do Barbalho, do PTB do Jefferson. É como se a presença desses caciques de comportamento moral questionável impedisse que houvesse honestidade nos demais membros dos seus respectivos partidos. Muitas vezes essa foi a lógica linear do PT. Cabe perguntar: e agora que alguns caciques petistas estão com sua postura ética abalada não seria compreensível que caíssemos na generalização, tal qual nos ensinou o “fundamentalismo” petista (Claro que, numa manobra patética e bem sem vergonha, tentam salvar os caciques, apresentando o Sr. “Delúvio” como o homem mais poderoso do PT, seja no que tange à informação, seja no que tange as decisões sobre a administração do partido. Aliás, essa me parece ser uma estratégia que aprofunda ainda mais a crise moral do PT. ) Quanto ao termo “fundamentalismo”, seu uso não é original, pois já foi utilizado nos debates internos do PT. Sua utilização se presta no sentido de que os chamados fundamentalistas (em geral) se consideram possuidores da verdade. Ou seja, há uma revelação, uma verdade disponível, que todos devem fazer o esforço para apanhá-la. O PT se considerava uma espécie de universo da revelação. Âmbito para o qual deviam convergir, necessariamente, as mentes esclarecidas e bem intencionadas. Essa visão de si mesmo virou hábito no comportamento petista. Há alguns meses, para exemplificar, na eleição pra prefeito de Porto Alegre, vi uma cena que me chamou a atenção para a vigência desse comportamento. Era uma esquina movimentada da capital, onde se reunia um grupo de pessoas, na maioria mulheres, com suas bandeiras e gritos de ordem pró Raul Pont. Fiquei por um certo tempo observando a movimentação até que passou, do outro lado da rua, um casal com uma bandeira do Fogaça. O grupo de petista, depois, de uma vaia, começou a gritar em coro: “alienados, alienados, ...”. Nisso me veio em mente a noção de “fundamentalismo”. Esse fato me pareceu ilustrar que a não opção pelo PT era considerada, pelos petistas da ocasião, como uma manifestação da ignorância, desinformação e até mesmo burrice. Fiquei pensando: como as pessoas podem se permitir julgar de “alienado” alguém com quem nunca conversaram, tampouco sabem da sua formação? Essa cena me pareceu ilustrativa, pois uma atitude dessas só pode ser tomada por quem se considera detentor da verdade, em contraposição àqueles que vivem no obscurantismo. Outros exemplos poderiam ser dados. Me lembro quando o recém empossado secretário da Educação do RS, José Fortunatti, foi vaiado do início ao fim de seu discurso no Fórum Mundial da Educação, em POA. Fortunatti realmente cometerá dois grandes erros: ser de um governo não petista e ter saído do PT. Aqueles que deixam o PT devem ser vaiados, não merecem ser ouvidos, afinal não pregam mais a verdade, e aqueles que entram para o PT oriundos de outros partidos (Emília, Werner, pra ficar na paróquia) na realidade sofreram uma evolução política, alcançaram a ilustração.
Pois é, o PT nos ensinou a pensar assim, com intolerância e maniqueísmo. Agora os líderes petistas nos convidam a observar que o PT possui alguns que, como diz o Lula, se “equivocaram”, mas, mesmo assim, tem muita gente boa. Não é fácil ter esse discernimento, pois nos meus tempos de PT não havia muito espaço para o exercício dessa capacidade de perceber que há pessoas honestas e desonestas em todos os setores, mesmo naqueles campos políticos divergentes. “Balaio de gatos” era coisa dos “partidos tradicionais”. Como vou aceitar ouvir do presidente Lula que “caixa 2” existe em todos os partidos se no PT se falava com orgulho que eram apenas os partidos tradicionais que possuíam máculas morais? O próprio presidente e outros petistas ilustres na tentativa de explicar (sem justificar, é claro) o “caixa 2”, fazem do PT um partido como outro qualquer, ou seja, um “partido tradicional”. Agora me pergunto, se no PT me ensinaram, e ensinaram tanta gente, ser intolerante com a política tradicional e seus partidos, por que agora devo ser tolerante com o PT?
Vou tentar, mas, pelo fato de, infelizmente, ainda ter influência da escola petista, confesso que vai ser difícil.