terça-feira, fevereiro 26

La Poderosa III


Dona Eva vende pães na estrada que leva até a La Poderosa. São deliciosos, bem como o queijo. Acho que ela não precisa desse comércio, mas deve ficar entediada em casa, esperando o regresso do marido, caminhoneiro, que faz longas viagens pelo Brasil, por exemplo, e então abriu uma tendinha para se ocupar um pouco. Ali se pode comprar fanta morna, salames, pepinos em conserva. Peço uma fanta, um pão, e fico de papo. Pergunto a ela se sabe quem é o dono de La Poderosa.
Dona Eva nem pisca o olho, conhece tudo por ali. "Os donos são o Seu Benjamim e a Dona Carolina. De vez em quando aparecem por esses lados", diz ela.
Eu também nem pisco o olho.
Seu Benjamin e Dona Carolina estão na lista das pessoas mais ricas do vizinho país chamado Brasil.
São os donos da Vicunha, da CSN, de um pedação da Vale e de outros quetais.
Acabou a história sobre quem é o brasileiro dono do haras "La Poderosa", no Departamento de Lavalleja, Uy.
O resto da história, em especial sobre as relações do Seu Benjamin com o senador Mercadante, está nas colunas sociais do hipismo brasileiro.
Monto na minha lambreta e sigo para uma visita de alguns dias ao amigo Rodrigo, praticar um pouco de carpintaria, que estou de férias.
Até breve.

sábado, fevereiro 23

Cavalgada


A foto é de Silvana Garzaro. O texto é da Isto é Gente:

"Mercadante na maior cavalgada do mundo
A maior cavalgada do mundo foi realizada no domingo 23, em Ouro Preto, Minas Gerais. A largada foi na antiga Coudelaria Real, onde Dom João VI deixava seus cavalos. Participaram da marcha 1.022 cavalos da raça Mangalarga Marchador que percorreram 15 Km da Trilha dos Inconfidentes.
O evento entrou para o Guinness Book. Entre os cavaleiros, estava o deputado federal Aloizio Mercadante. “Cavalgar é uma das minhas paixões. Quando tenho tempo, monto e passo dias no meio do mato”, disse Mercadante. O organizador da prova, Marcelo Baptista de Oliveira, proprietário do Haras Maripá, principal criador da raça no País, liderou a cavalgada ao lado de sua mulher, Sophia Rondon de Medeiros Baptista de Oliveira, bisneta do marechal Cândido Rondon. “Todas as manhãs vamos para a Hípica Paulista, em São Paulo, onde cavalgamos. É a nossa terapia de casal”, contou."

Os butiás estão no bolso, como se diz por aqui no pampa. Eu mesmo, se tivesse mais tempo, voltaria a cavalgar. Até hoje me recordo com prazer de montar a cavalo ali na Fazenda São João, em Formigueiro. Uma vez cheguei mesmo a levar uma tropinha até o fundo do Formigueiro, junto com uma gauchada de primeira, incluindo o Negro Cafuncho. Meu primo Cleber, vaqueano como poucos guris, é testemunha.
Andar a cavalo é uma das coisas mais emocionantes que se pode experimentar na vida; aquela potência no meio das pernas da gente, animalidade pura, e ainda por cima, se bem domado, ao nosso bel controle, a quê comparar?
Minha vida é na cidade, um professor.
Hoje minha pequena poderosa é uma lambreta, ferro e borracha que nada tem a ver com a potência animal de um mangalarga. Mas é o que tenho para montar. Amanhã dou uns laçaços nela, para matar a saudade.
Eu não fazia a menor idéia que o Senador gostava de montar a cavalo. Chegou a entrar para o Guiness, vejam só.

sexta-feira, fevereiro 22

Protesto


Um dos leitores mais assíduos escreve um enérgico mail:
"Pergunto se você não poderia postar uma matéria-protesto contra o esgoto a céu aberto que atravessa o bosque e a pista de caminhada da UFSM. Dependendo do dia, o cheiro daquilo é insuportável. Pena que a câmera fotográfica não capture, ainda, cheiros. A pista de caminhada da UFSM é, certamente, um dos locais mais frequentados do Campus, e é inadmissível que uma universidade como a UFSM (ou qualquer outra!) se encontre numa situação dessas. Por falar em bosque, abriram na última sexta-feira um enorme clarão no bosque, desconfio que para começar as obras do Centro de Eventos. Por falar em esgoto, dizem que o lençol freático da UFSM está contaminado. Pergunto, novamente, se numa instituição que pretende ser produtora de conhecimento de alto nível e que possui um Comitê de Ética uma situação dessas é admissível."
Tá postado! Eu não diria melhor.
Para essa situação nosso vice, que está pessoalmente empenhado no Centro de Eventos, não poderia dizer que "cada dia é uma surprêsa!"
Na foto, o local do futuro Centro de Eventos, que está tirando o sono dos donos das empresas de formaturas.

Feist


Taí a linda. Se eu soubesse como, colocaria aqui meu mp3 favorito, "Silent Heart". Como não sei, tem trechos do ultimo disco dela, The Reminder, aqui.

Feist na Rolling Stone


Em novembro de 2005 Gabriel estava no Canadá e me escreveu dizendo isso: "Fui apresentado hoje a uma cantora canadense que acho que tu iria gostar. O nome dela é Feist, e o disco é Let It Die. Se tu não conseguir baixar da pra ouvir nesse site http://www.galleryac.com/index.php. Ah sim, e ela é linda... Um abração, Gabriel"
"Let it die" havia sido lançado em 2004.
Foi ouvir e gostar. Desde então Feist faz parte da minha lista de cantoras favoritas. Ela ganhou três páginas na Rolling Stone de Fevereiro.
A Conexão Brasilis do número de fevereiro é muito boa. Traz a história daquela que foi considerada a melhor escola pública do Brasil, o Ciep Guiomar Gonçalves Neves, da cidade de Trajano de Moraes, no Rio de Janeiro. A matéria de Carolina Benevides, com fotos de Gerson Nascimento, deveria ser lida por todas as escolas públicas do Brasil, para mais pessoas se darem por conta que as soluções mais importantes, para se reverter a profunda crise do ensino brasileiro, dizem respeito ao modo como os professores encaram seu trabalho. A reportagem dá um nó no peito da gente.
Tem também uma matéria sobre fazendas de senadores da república que acobertam trabalho escravo. De doer, também. Mas esse assunto, de fazendas de senadores, vamos deixar para outra hora.

Um deus passeando pela brisa da tarde


Esse gajo aí ao lado é Mário de Carvalho, lisboeta e escritor. Terminei de ler, dele, "Um deus passeando pela brisa da tarde" (Cia das Letras, 2006), uma história que se passa em uma pequena cidade da Lusitânia, nas fraldas do império romano, no século II d.C, inícios do cristianismo. A história está narrada pelo duúnviro (autoridade máxima local) Lúcio Quíncio, que se vê no meio de uma complexa situação: a cidade é assediada, pelo lado de fora, pelos mouros e as defesas e os muros dela são frágeis; os lusitanos de Tarcisis (o nome da cidade) são assediados pelo lado de dentro pelos cristãos - a turma do peixe - que começam a difundir suas idéias e criticar as demais religiões e alguns hábidos da cidade, e com isso despertam profundos ódios na comunidade; Lúcio é assediado por pensamentos e emoções que lhe impedem de agir da forma como a turbamulta gostaria. Entre esses assaltos destaca-se o que provém da relação dele com uma nobre romana convertida ao cristianismo. Mais não digo para não tirar o gosto do leitor. O romance vai num crescendo de tensão e expectativas: conseguirá a cidade resistir ao ataque de milhares de mouros, desprovida que está de qualquer guarnição decente? Como ficam as relações do cristianismo e de seu deus em um ambiente de dezenas de religiões? E como o duúnviro lidará com o fascínio que sente pela bela romana convertida e intransigente em sua crença?
Quem me recomendou esse livro foi o Jairo José da Silva, como já indiquei em alguma postagem anterior.
Valeu cada linha.

Entendimento discursivo


Um leitor manifestou curiosidade em relação à expressão "entendimento discursivo", que tenho empregado com certo abuso. Faço aqui uma nota sobre isso. Eu deveria ter escrito sempre "conhecimento discursivo", para fazer justiça a um dos contextos de uso da expressão. Trata-se da "Suma Contra os Gentios", de Tomás de Aquino. O livro data de 1313, aproximadamente, e representa a obra madura do teólogo Aquino. No primeiro capítulo Tomás trata da natureza de Deus, usando um método que combina a "via negativa" (dizer o que Deus não é) com a via positiva (dizer o que ele é). Assim, Deus não é corpo, nele não há acidente, e Deus é bom e uno. Nesse andor, Tomás chega ao problema de caracterizar o modo do conhecimento divino. Aqui, novamente, a solução é comparar o tipo de conhecimento que Deus tem com o tipo de conhecimento que os homens tem. Assim, Tomás expõe, falando de Deus, sua teoria do conhecimento humano. Para o que me interessa aqui, Tomás indica dois tipos de conhecimento. Um deles é o conhecimento "raciocinante ou discursivo", "quando, tendo pensado em uma coisa passamos a outra, como no silogismo, no qual vamos das premissas para a conclusão" (SCG, Livro I, Cap. LVII). O intelecto humano funciona, diz ele, na base da composição e da divisão, uma coisa torna-se conhecida por meio da outra. Já o intelecto divino não precisa compor e dividir, não precisa saber primeiro uma coisa e com base nessa passar para outra. Deus considera tudo simultaneamente, numa só operação. Seu pensamento não depende de raciocínio. Tomás não usa a expressão, mas se poderia dizer que o conhecimento divino é "intuitivo", não depende do caminho demonstrativo. A oposição que ele faz é entre "raciocinante" e "intelectivo".
A razão humana, conclui ele, é algo imperfeito. Precisamos saber uma coisa depois da outra, uma coisa por meio da outra.
O preço do conhecimento é a contínua vigilância aos equívocos do silogizar.
Assim, o entendimento divino, que não silogiza, não é discursivo.
Para que uma criatura seja dita provida de entendimento discursivo, deve silogizar.
Disso não se segue que os animais sejam desprovidos de linguagem.
Tampouco se segue que todos os animais providos de entendimento discursivo silogizem.
PS: os professores de Filosofia, essa disciplina que esse ano vai entrar em todas as escolas, ensinam a negação de proposições universais?

quinta-feira, fevereiro 21

Emas


Sobre o cornichão, as emas. No Uruguay tem muitas. Emas são criaturas desprovidas de entendimento discursivo. A falta de entendimento discursivo faz com que o mundo emocional das emas seja inteiramente diferente daquele das criaturas providas do mesmo. Emas esperam, por certo, mas nada que tenha a ver com "amanhã" ou "semana que vem". Eu, por exemplo, estou em férias e espero, com alguma ansiedade, voltar a esse agradável país vizinho nos próximos dias. Para os cidadãos da Boca do Monte nos fica muito perto, o Uruguay.

Banquinho


Desde ontem estou que nem as raposas do Uruguay, esperando. Elas esperavam comida, eu espero em vão um telefonema. Dizem que o homem está se recuperando, quem sabe vai levar alguns dias. Ainda bem que estou de férias e tenho um banquinho, quem nem aquele do Mestre Guina.
Os programas de edição de fotografia tem uns dispositivos automáticos de remoção de olhos vermelhos; eu precisava de um programinha de remoção de olhos brancos, das raposinhas.

Cachilas




Os anos sessenta e setenta parecem ter sido a década de ouro da exportação de automóveis antigos para os Estados Unidos, em especial. Os Ford 29 e os Chevrolet eram buscados por todos os lados e lotavam navios. Hoje a saída desses carros é dificultada pela lei. Sobram os banhados do Aceguá. Esse azulzinho aí de cima estava vendido por U$2.500 para um brasileiro.

Carros e surpresas


"Cachila", dizem no Uruguai, para os automóveis antigos. Esse Dogde Limusine está dentro de um galpão na beira da estrada entre Minas e Solis de Mataojos, próximo da estrada que leva ao camping de Águas Claras e à La Poderosa, referida abaixo. O Dodge está a venda por cinco mil dólares. Tem quem compre.
Falando em carros, a ultima vez que a Ufesm se viu envolvida, em algum sentido, com escândalo de automóveis, foi no início dos anos oitenta, se lembro bem. Um pequeno grupo de professores comprou automóveis a preços de banana, e um belo dia a polícia veio e levou tudo. O constrangimento, na época, surgiu pela desculpa esfarrapada que foi apresentada para os preços baixíssimos que cada um havia pago pelas belas viaturas: eram carros recuperados por seguradoras, etc. Responderam processos.
Agora surge outro possível caso de carros na Ufesm. Diz a ZH hoje e disse o Diário ontem que "professores teriam recebido dinheiro e carros". O fato motivou, de acordo com a ZH, uma linda frase do vice-reitor da Ufesm, "cada dia é uma surpresa!" Não posso esquecer de anotá-la na minha caderneta.
Dezenas de professores andam todos os dias em automóveis comprados com o dinheiro de projetos. O caso motivou uma recente decisão do Consu, a Resolução N. 016/07, que "disciplina o uso de veículos automotores de transporte rodoviário adquiridos com recursos de projetos, convênios e/ou contratos na Universidade Federal de Santa Maria e revoga a Resolução N.002/2007." Parece que uma das discussões mais importantes ocorreu em torno da obrigatoriedade ou não de usar um sinal identificador do tipo "uso exclusivo em serviço".
Alguns professores ganharam (e ainda ganham) bolsas por meio da Fatec. O que se dizia é que algumas delas não exigiam do ganhador pouco mais do que algumas assinaturas. Eram algo parecido a laranjas. Eu tive o depoimento de uma servidora da Ufesm que agradeceu o convite para receber uma bolsa, a troco de uma assinatura mensal e olho distraído.
Outras bolsa são quentes e demandam trabalho real.
Onde está o joio, onde está o trigo, o policial que deixou escapar essas notícias não ajudou muito a saber.
PS: um leitor escreveu lembrando essa história dos carros baratos; segundo ele, um dos intermediários era funcionário da casa. Obrigado!

La Poderosa


Na imagem do Google Earth, a localização da estância "La Poderosa".

quarta-feira, fevereiro 20

"La Poderosa"





Nesses poucos dias que estive no Uruguai, em meio a uma conversa com amigos, um deles comentou a exuberância econômica demonstrada por um senador brasileiro que comprou terras ao lado de onde estávamos. O dito senador seria o feliz proprietário de um haras, de área total não conhecida pelo meu amigo. O nome do estabelecimento é "La Poderosa". O dito senador teria feito uma oferta de compras de uma outra área, vizinha, no total de cinco mil hectares. O preço do hectare por ali pode chegar a novecentos dólares.
Mas quem seria o tal senador, pergunto eu. O morador local disse que era Aloísio Mercadante.
Eu sorri com ceticismo, como o leitor compreenderá.
Aloísio Mercadante é uma reserva moral do Senado Brasileiro, professor universitário como eu, um ex-presidente da Andes, entidade que ajudei a construir nos idos dos anos oitenta. Ele, se provido fosse de recursos tais, dificilmente teria como prioridade de investimento comprar terras no Uruguai para criar cavalos.
Aliás, muito bonitos.
Meu interlocutor teria se confundido, argumentei. Afinal, há tantos brasileiros comprando terra no Uruguai, quem sabe algum senador, mas Dom Mrcadante me parece pouco provável.
Continuei expressando meu ceticismo para esse conhecido que, diante de minha descrença e temeroso de me ofender achou melhor mudar de tema, como se diz por lá.
Na dúvida, hoje, escrevi para o Senador perguntando sobre o tema.
Algum leitor ficará na dúvida se eu deveria repartir essa conversa com os demais oito leitores do blogue. Eu pensei sobre isso e concluí o seguinte: esses conhecidos de Lavalleja insistem em contar essas histórias sobre o senador e não sou o primeiro brasileiro a ouvir esses assuntos. Se o senador me responder dizendo que isso é uma grande besteira, posso esfregar na cara desses uruguaios que eles estão inventando lorotas.

Uruguai


O último número da edição brasileira de "Le Monde Diplomatique" (ano 2, numero 7, fevereiro) traz um artigo de duas páginas da santamariense Deisy Ventura, sobre as desventuras do mercosul. Segundo ela, o que há de mais vivo no Mercosul deve-se às iniciativas da sociedade civil e não às ações efetivas dos governos, que gastam semestralmente mais de um milhão de dólares nas reuniões de trabalho, grupos de estudo, etc. Um belo artigo, recomendo.
Andei por uns dias no Uruguai. Acho que dona Deisy tem razão. Um dos estabelecimentos que visitei, na beira da estrada que liga Minas a Solis de Mataojos vende carros antigos. O dono comentou que seus clientes preferenciais, noventa por cento, são brasileiros. Um Citroen 1950 bem ruim das bielas vale quatrocentos dólares. Um Dodge Limousine de cinquenta e poucos e em estado razoável vale cinco mil dólares. Eles entram no Brasil pelos banhados de Aceguá. Não estão nem aí para os procedimentos jurídicos previstos pelos burocratas.
Na foto, um Dodge Custom, quase inteiro, diz o rapaz que os apresenta aos brasileiros compradores. No Uruguai há uma lei que protege os carros antigos, considerados como patrimônio do país.

quarta-feira, fevereiro 13

Lasciate ogni speranza...

O reitor da Unebê, Timóteo das quantas, deu uma entrevista ao Jornal Nacional tentando explicar porque era válido, justo e inserido no contexto gastar duzentos e tantos mil reais em decoração de um imóvel funcional para sua moradia, o que incluía lixeiras de 900 reais cada uma.
A culpa era da estética, disse ele. Os móveis tinham que seguir uma linha estética.
Seguindo a linha, o pagamento dessas extravagâncias decorativas foi por conta da Fatec deles
Não se fazem mais reitores como antigamente.
Depois dessa, eu, que critico o simplismo do nosso sindicato, que quer acabar com a Fatec, fico mal, seu Timóteo.
O nosso ex foi capaz de presidir a reunião que o elegeu como reitor, mas nunca ouvi dele essas conversas sobre estética. Ele, como declarou por escrito aos jornais, apenas via as oportunidades e as apresentava para seus colegas diretores, que assinavam os contratos. Depois, deu nisso que estamos vendo. Está só no começo, mas, como leitor de Dante, fico apreensivo com as esperanças.

Pau Fincado



Claudemir Pereira (obrigado!) informa que o Deputado Paulo Pimenta convida a todos para uma visita às obras da BR 158, no sábado. Não vou poder estar por lá, mas deixo uma sugestão de dois pontos turístico-políticos de visitação ligados a essa estrada. O primeiro liga a BR 158 a um possível e ainda não contado episódio da história da corrupção no Brasil e está localizado nas coordenadas - será conveniente levar um GPS - 29*55'38.20" S e 54*14'06.78"; elas colocam o turista sobre um viaduto que foi construído na BR 158 faz muitos anos, mais de trinta, com certeza. Basta parar no viaduto, descer do carro e olhar para os lados para ver que embaixo da ponte deveria haver uma estrada. Seria uma estrada de ferro. Seria. Milhões de cruzeiros foram gastos em terraplanagem, como se verá. Hoje, depois dessas décadas de abandono ainda existem as cercas que separam o inaproveitado leito dos campos da região. Esses enormes trechos foram desapropriados? Foram pagos? E a terraplanagem de dezenas de quilometros, hoje abandonados, alguém algum dia respondeu por isso?
Essa é uma das histórias que valeria a pena contar sobre a BR 158 e adjacências.
Para o leitor que não puder integrar a caravana, postei uma foto do Google Earth na qual ele poderá ver a tal estrada feita e abortada, as erosões, etc. A região é conhecida como Campo da Pedra, logo depois da propriedade de Dom Avelar.
Andando mais um pouco, vem o outro ponto turístico, a Coxilha do Pau Fincado. Ali ficava o bolicho do Sr. Rubilar. O bolicho era próspero, o maior da região. Com a progressiva melhoria da estrada, foi definhando. Faz poucos anos que o Sr. Rubilar morreu. Quando conversei com ele pela última vez, tomando fanta morna na sombra de um cinamomo, ele falava do sonho de ver o asfalto na frente do bolicho, nem que para isso ele tivesse que perder o bonito galpão que ficava bem no trecho onde deveria passar a estrada, medida e remedida tantas e tantas vezes.
Agora, a outra história. Ou estória.
A Coxilha do Pau Fincado, diz uma lenda da geografia da campanha, é um dos divisores de águas mais importantes do Rio Grande do Sul. Houve um sonho geo-hídrico-político, certa feita, de se construir um gigantesco canal que uniria as duas metades do Rio Grande. Na época, quem sabe, alguma empresa de consultoria foi contratada a peso de cruzeiros para fazer algum estudo de viabilidade.
Poderia haver hoje ali um bolicho, um canal de águas e uma fita de asfalto, oigalê.
O Seu Rubilar morreu sem ver o asfalto, que chegou na Coxilha faz poucos dias, perto do Carnaval. No canal de águas, ele nunca acreditou, que crendice tem limites.
O Pau Fincado é um tronco de madeira, que ainda está lá, cravado no barranco, uns cem metros antes do bolicho, no lado esquerdo da estrada. Com olho bom, dá para ver no Google Earth.
A BR 158 elegeu muita gente, como se sabe.
Agora, diz o deputado, vai. Depois de mais de trinta anos e de muita gastança sobre a qual pouco se sabe.
(PS: na segunda imagem acima há uma informação errada: o viaduto é "na" Br 158, e não "sobre a BR 158", como consta ali por culpa minha. E o bolicho do Rubilar ficou embaixo do alfinete.)

terça-feira, fevereiro 12

Pensar

O Diário e a Razão de hoje trazem matéria com o Prof. Koff, atual presidente da Fatec e Diretor do CCSH da Ufesm, dando conta que a Fatec "poderá deixar de fazer as provas para exames de motorista", como indiquei na postagem de ontem.
"A Fatec está trabalhando sem receber", diz o Prof. Rogério. "Estamos cancelando outros compromissos para compensar as perdas com esse contrato."
A senhora presidente do Detran diz que o problema é da Fundae, que subcontratou a Fatec.
O Prof. Rogério parece ter razão. Não pega bem entregar por muito menos o serviço que foi contratado por um tanto mais. O Detran está pagando apenas trinta por cento do estipulado, informam os jornais.
A saída terá que ser bem pensada. Uma delas é seguir empurrando com a barriga até que o governo encerre o contrato com a Fundae, rapidinho. E o prejuízo da Fatec fica por conta da diminuição da gritaria geral.

segunda-feira, fevereiro 11

Fotos

As fotos das criaturas desprovidas de entendimento discursivo abaixo comparecidas são de minha autoria. Mais, no flickr.

Bufo


Os CFC's (traduzindo: Centros de Formação de Condutores) aproveitaram a onda da crise do Detran e bufaram; querem aumento das taxas; os custos aumentaram, etc. o governo rebufa: vai credenciar novos cfc's. O distinto público tribufa: quer autorizações mais baratas para guiar os autinhos, de preferência sem essas frescuras de parar na faixa preferencial para pedestres. Dona Yeda, por sua vez, quer carteiras mais baratas para seus eleitores e que ela não tem nada a ver com esses assuntos de propinas do Detran etecetera e tal e coisa.
Os sapos, criaturas inteira e completamente desprovidas de entendimento discursivo e polegar opositor, continuam fazendo o que mais sabem fazer: sapear e bufar.
A Fatec, enquanto isso, continua fazendo seu trabalho, mesmo que bufando, pois lhe estrangularam: por força de determinações legais, a torneira dos pagamentos de seus serviços está a conta-gotas. Algumas pessoas usaram o entendimento discursivo disponível e concluíram daí que a folga era grande. "Ergo", pensaram, "demonstrandum est" a tal da corrupção.
O entendimento discursivo é uma coisa difícil de explicar em poucas palavras. O bom mesmo é ler Tomás de Aquino.
Na impossibilidade do povo em geral ler o bom Tomás e entender o perigo, periga a Fatec suspender os serviços nos próximos dias.
A bufança vai ser grande.
Tem a ver com amor próprio ou algo assim, meio ferido.
Para bom entendedor.
Mais bufos no Flickr.

A síndrome da girafa


Girafas desafiam o argumento do desígnio, se poderia pensar. Dormem de pé, para beber água é o maior trabalho. Dependem de ramos saborosos na parte de cima das árvores. Desprovidas de entendimento discursivo, salvo melhor juízo, olham tudo por cima. Eu não sei se elas escutaram o programa da Gaúcha hoje, sobre o Detran. Se escutaram, não adiantou nada, pois são desprovidas de entendimento discursivo e de polegar opositor. Os deputados querem saber se dá para diminuir o custo das carteiras, se há reprovações em excesso nos exames de motorista.
Eu não entendo nada disso, nem de girafas, nem de exames de motorista.
Por mim não deixaria as girafas livres, porque elas morreriam em poucos dias.
Por mim reprovaria mais ainda mais motoristas, porque os que andam por aí são um vexame. A gente pára na faixa branca para o pedestre passar e o idiota que está atrás periga buzinar.
Os deputados são providos de entendimento discursivo, smj.
Mas, como perguntava o programa de hoje, vamos ver se eles tem algo roxo para sair atrás dos graúdos.
Graúdo, aqui, leia-se gente que tem banquinho de espera em tribunais e câmaras e assembléias e outros refrigérios públicos.
Apertar bagrinho? Eu não quero que duvidem que os deputados sejam providos de entendimento discursivo. Para isso terão que ir além dessa síndrome da girafa que ronda as cepeís pelo Zilbra afora: dar uma olhada por cima e tirar uma casquinha.
Vou voltar a ler Santo Tomás de Aquino.
Me esperem.

Porquê


As criaturas que são dotadas de entendimento discursivo tem como característica predominante a capacidade de fazer perguntas, em especial a pergunta "porquê".
Quando um sujeito pergunta porquê um outro sujeito acredita em tal e tal coisa, o outro pode oferecer pelo menos três tipos de respostas.
Seja o causo do gauchinho que acredita nas virtudes da doma racional.
Em primeiro lugar, o gauchinho pode invocar os antecedentes que o colocaram o na situação de acreditar naquilo. O domador de cavalos que acredita nas virtudes da doma pelo caminho suave, sem a quebra do queixo, nos responde contando a gênese de suas crenças, nos contando o modo como as adquiriu. Poderemos mencionar as circunstâncias, os fatos sociais e culturais, psicológicos, relativos a sua crença. A resposta nos remete a um pedaço de biografia do gauchinho e, através dela, a um fragmento de história.
Em segundo lugar, o gauchinho poderia nos lembrar os motivos que o levam a aceitar nas virtudes da doma racional. Nesse caso respondemos explicando a função que tem a aceitação dessa crença na realização dos desejos, intenções e necessidades do gauchinho. Por exemplo, os fazendeiros novatos hoje se revoltam com a doma tradicional e não querem ouvir falar dela. Se a primeira resposta descrevia a origem da crença, esta segunda se refere aos supostos e conseqüências psicológicas da crença; ele quer o emprego, por exemplo, acima de qualquer convicção.
Em terceiro lugar, pelas razões que o gauchinho tem para considerar que a doma racional deve ser levada em conta. Nesse caso respondemos chamando a atenção para a justificação racional que o gauchinho dá para suas crenças. Então não mencionaremos fatos da biografia ou da psicologia do cujo e sim relações entre a crença dele e outras crenças e operações cognoscitivas. Não faremos referência à genêse e nem às conseqüências da crença, senão que à certas operações que ele tem que realizar para considerar a doma racional como relevante no mundo e a certas características da crença. Ele estudou o assunto e tem argumentos racionais para defender sua atitude perante os animais desprovidos de entendimento discursivo.
Em todo caso, é curioso como os domadores se referem aos cavalos com termos da psicologia humana. "Temperamento" é a expressão favorita.
As zebras não são dotadas de entendimento discursivo. Não sei porquê as zebras se transformaram em símbolos do azar.
Obrigado, Luis Villoro.

Família


O pequeno hipopótamo é inteiramente desprovido de entendimento discursivo, ao que parece. Sobrevive. O irmãozinho não parece ter tido a mesma sorte.

Água


Era a hora da onça beber água e por casualidade eu passava por ali.
Mesmo no zoológico é muito rara essa cena da onça bebendo água. A onça preta, também conhecida por "panthera onça", na falta de roedores e lagartos, seus pratos preferidos, precisa se contentar com carne de cavalo. Dentro da jaula, descongelado. A onça preta, pelo que se sabe, é desprovida de entendimento discursivo e não tem a oportunidade de pensar sobre o azar.

O perigo



Não é uma ema, e sim um avestruz. Ele está um pouco afastado do fluxo dos visitantes, no Zoológico de Sapucaia. Quando as pessoas param e se demoram a vê-lo, o bicho aproxima-se dos admiradores e faz o ritual de cortejo, que consiste em ajoelhar-se diante das pessoas, abrir as asas e, com elas bem abertas, fazer evoluções com o pescoço, desenhando uma espécie de oito, durante uns trinta segundos.
Ao contrário do que muita gente pensa, o tal de comportamento de avestruz, que consistiria em afundar a cabeça dentro de um buraco quando o perigo se aproxima é pura conversa fiada, sem nenhuma comprovação etológica.
O tal de comportamento de afundar-se diante do perigo é característico de humanos e de instituições.
O avestruz não é dotado de entendimento discursivo, coisa que é de conhecimento público, mas é considerado meio safado pelos tratadores.

Memória


O primeiro elefante a gente não esquece. É a Pink, uma sobrevivente. Haviam três no Zoológico de Sapucaia do Sul. Dois caíram no fosso que circunda o espaço dos elefantes e morreram. A Pink vai se aguentando. O Zoológico também. No seu auge, tinha mais de 200 funcionários de carreira. Hoje é tocado por 70, os demais é serviço terceirizado. É o maior do Brasil, com uma área de mais de 700 ha. Foi criado por iniciativa de Leonel Brizola, no seu governo de 1959 a 1963. Hoje é um pulmão verde encravado em plena zona urbana de São Leopoldo, Sapucaia e adjacências.
Dizem que os elefantes tem boa memória.
O Prof. Reitor da Ufesm disse em entrevista para um jornal local no dia de ontem que "O caso Detran foi uma exceção". A frase foi essa: "... o caso Detran foi uma exceção ao longo dos 47 anos de existência da UFSM." Eu achei um pouco estranha a frase, pois ainda não foi divulgado o inquérito do "caso Detran" e assim o verbo no passado fica curioso. Sem falar que não sabemos as surpresas que nos esperam em 2008.
A entrevista começa com uma declaração curiosa: "A minha eleição também foi para resolver estas situações que prejudicaram e prejudicam a imagem desta universidade."
Como assim? Será que os eleitores sabiam disso? Não entendi.
Por fim ele volta a um ponto que tem dado o que falar: "Quero esclarecer que as Fundações de Apoio, Fatec e Fundae não são da UFSM. Elas são Instituições Privadas, credenciadas junto à UFSM com aprovação do Conselho Universitário."
Pink só tem memória, entende muito pouco desses assuntos. Se entendesse, por certo concordaria com o Prof. Reitor. Mas acharia curioso que a tal instituição privada, por estatuto, só pode ser dirigida por professor da Ufesm. E à luz disso é que ela acharia ainda mais curiosa a seguinte afirmação do Prof. Reitor:
"Volto a dizer que as instituições são boas, o que as prejudicam é a presença de gestores que adotam comportamento indevido e prejudicial ao interesse coletivo. As Fundações de Apoio existem para servir e não para se servir das Universidades".
Pink gostaria de saber, se fosse dotada de entendimento discursivo e polegar opositor, a quem o Prof. Reitor se refere - uma descrição definida ajudaria - com a expressão "gestores que adotam comportamento indevido". Os gestores não eram professores da confiança da passada e presente administração?
Vamos guardar na memória a frase e esperar, sentados, as calendas de março.

quarta-feira, fevereiro 6

Campos da Campanha


Passei a terça de carnaval me embebedando com o que resta de paisagem de campos da campanha. Cacequi, São Vicente, São Francisco de Assis, foi uma festa para os olhos com os butiazeiros e espinilhos, perdizes, seriemas, zorrilhos, cerros e banhados, estepes e savanas, que aqui a gente chama simplesmente de campo, campanha, campina, pampa.
O inhanduvai é uma das espécies ali presentes. Acompanhado que estava de um especialista no assunto, visitei um desses raros grupamentos. As fotos estão no flickr.
Para quem espera a estrada de Rosário ficar pronta, vai a notícia: ontem, terça de carnaval, percorri o trecho de chão após o Pau Fincado: as obras prosseguiam como se fosse um dia normal de semana, dezenas de máquinas na pista. Restam por fazer pouco mais de vinte e cinco quilômetros. Algum índio mais corajoso pode ir a Livramento por ali se não tiver muita pena do auto.
A grande atração de São Chico de Assis é a família de bugios que mora na praça. O macho é chamado de Lula. Passa a maior parte do tempo olhando para sua companheira, uma bela bugia de pelagem avermelhada. Ela, por sua vez, pouco olha para Lula; passa a maior parte do tempo cuidando do bugiozinho ao colo. Esse, por sua vez, dá suas escapadinhas dos braços da mãe e brinca de ficar dependurado nas grimpas dos guapuruvus e jacarandás. Tão pequenino e tão arteiro, o tal bugiozito.
Nesses tempos de descuido para com a família, vale a pena uma visita aos campos da campanha.
Pena que esqueci de comprar meu banquinho de espera. Seria de boa serventia para olhar bugios.
A vovó-sentada da padaria da praça é memorável.