quarta-feira, novembro 15

Filosofia na Folha, 2.

Agora transcrevo um trecho da entrevista de Roberto Machado
"FOLHA - O sr. concorda que parece haver pouca criatividade filosófica no Brasil? Qual é a explicação possível para isso?
ROBERTO MACHADO - A pergunta é boa, mas exigiria uma resposta que não sei se sou capaz de dar. De todo modo, o que posso dizer é que o trabalho para esse livro foi muito formador. Porque fui capaz de comprovar, com relação a mim mesmo, uma coisa que considero uma deficiência dos estudos filosóficos no Brasil. Caímos numa perspectiva de especialistas num período, num autor, e até mesmo especialistas num livro.
O que me chama a atenção é que em geral as pessoas restringem o seu universo ao daquele filósofo eleito como um paradigma do que seja filosofar. E não se chega nem ao estudo daqueles com os quais ele tem uma relação profunda.
Uma grande lição que comprovei com esse estudo é que não se começa do nada. Não existe tábula rasa -sempre se pensa a partir do que outros pensaram. O interessante para mim, na leitura desses documentos sobre a tragédia e o trágico, foi a demonstração de que é sempre com pequenas reapropriações, com pequenas torções que, dentro de uma região de idéias já produzidas por outros, se chega a um pensamento novo, diferencial. Um bom exemplo disso é de como Schelling retoma a teoria do sublime de Schiller -profundamente marcada por Kant- numa perspectiva metafísica.
Creio que uma das dificuldades da filosofia brasileira é que em geral abdicamos de pensar filosoficamente para fazer unicamente história da filosofia. A filosofia brasileira, mais ou menos até a década de 60, me parece ter sido marcada por um ensino doutrinário, aquele que privilegia um sistema filosófico como verdadeiro, o expõe como um conjunto de teses e situa, a partir dele, os outros sistemas como erro, desvio, ignorância.
Ora, com a importância que adquiriu a pós-graduação no Brasil, a partir do modelo da USP, para combater esse modelo, representado principalmente pelo tomismo, as pessoas se preocuparam menos em fazer filosofia do que em saber filosofia, em assimilar com rigor a filosofia dos outros. O conhecimento dos filósofos é importante, e até mesmo indispensável, mas a filosofia não pode ser reduzida a isso. O conhecimento da história da filosofia é uma condição necessária, mas não uma condição suficiente para que alguém se torne filósofo.
FOLHA - Esse modelo da USP era explícito, não é?
MACHADO - Sim. É muito fácil você encontrar um filósofo que diga: "Não sou filósofo; sou historiador da filosofia". Defende-se o rigor, mas ousa-se pouco. O que mais se precisa na filosofia brasileira é de coragem. Esse livro que escrevi é mais temático do que monográfico.

4 comentários:

Cé S. disse...

Acho que RM tem razão. Os filósofos brasileiros são zagueiros.

Unknown disse...

Viram a Cult desse mês?

Ronai Rocha disse...

Conta prá gente.

Unknown disse...

Conto:
A Capa é do Deleuze e a afirmação: "Um dia o século será deleuzeano". O dossiê foi escrtito por pessoas como Suely Rolnik, Peter Pál Pelbart, e Roberto Machado.

Também tem uma entrevista com o Sérgio Paulo Rouanet sobre a figura do intelectual, tema da postagem.
Eu gostei da revista. E, veja só, essa preciso contar ao Frank - o mundo é redondo mesmo... - aquela revista "Scientific American - Gênios da Ciência", esse mês: "A Vanguarda Matemática e os limites da Razão". Muito interessante.

Ronai!
Vou te mandar um email, estou com umas idéias para o período Pós-Vestibular, que quero compartilhar.

Saudades!