terça-feira, dezembro 19

"Ao volante do Chevrolet"

Dias atrás saí da Cesma pensando nuns versos de Fernando Pessoa, que lembrava apenas vagamente. Versos raros, nos quais o poeta descreve seus sentimentos, dirigindo um automóvel de Lisboa até Sintra; versos raros, nos quais o poeta declina a marca do carro que dirige; o poema começa assim:
"Ao volante do Chevrolet pela estrada de Sintra, ao luar e ao sonho, na estrada deserta, sozinho guio, guio quase devagar, e um pouco me parece, ou me forço um pouco para que me pareça, que sigo por outra estrada, por outro sonho, por outro mundo, que sigo sem haver Lisboa deixada ou Sintra a que ir ter, que sigo, e que mais haverá em seguir senão não parar mas seguir?"
Por duas vezes Pessoa fala no Chevrolet, que tem emprestado, apenas: "Eu, guiador do automóvel emprestado, ou o automóvel emprestado que eu guio? Na estrada de Sintra ao luar, na tristeza, ante os campos e a noite, guiando o Chevrolet emprestado desconsoladamente, perco-me na estrada futura, sumo-me na distância que alcanço, e, num desejo terrível, súbito, violento, inconcebível, acelero..."
Lembrei desse poema de Pessoa, caminhando nas proximidades da Cesma, porque fiquei pensando se havia sido justo no meu comentário sobre o início do livro de Lion Goya, "Projeto AIC-Metamorfose", do qual disse que havia empacado por causa da sigla da caminhonete GM-S10. Afinal, a General Motors nada mais é do que a fabricante do venerável Chevrolet (A GM usou esse poema numa peça publicitária aqui no Brasil, faz muitos anos!), e nunca reclamei para mim mesmo do Pessoa usar marca de carro no seu poema.
Pensado isso, fiquei quieto, nesses dias de poucas palavras, mas não deixei de pensar, em mais de uma vez, se não teria eu sido um tanto quanto impertinente na minha postagem.
Hoje recebi um mail do Lion Goya. Transcrevo.
"Caro Ronai,
É com satisfação que vejo o comentário do meu livro no seu blog. Pena não teres tido saco para continuares lendo, quando empacaste, segundo o seu próprio termo, na sigla GM S10 (GENERAL MOTORS modelo S10). A contextualização do cenário em ambiente local e no Brasil foi um das minhas opções. É impossível agradar a todos. Outros, parece que é possível...
Olha que interessante o que foi publicado sobre o meu livro no jornal da tarde em São Paulo, que está disponível no site da CBL (Câmara Brasileira do Livro).
http://www.cbl.org.br/news.php?recid=4400&hl=conspirações%20made%20in%20brazil
Se estiveres interessado em realmente ler todo o livro e quiseres um exemplar para isso, posso pedir para os meus editores te enviarem um. E se as siglas te incomodares vai enviando e-mails que posso ir te traduzindo. Já que pareces ter, pelo menos com siglas, dificuldades.
Abraços,
Att
Lion Goya"

Agradeço a atenção. De fato, tenho muitas dificuldades, a maioria invencíveis, azar meu; conheço bem siglas de automóveis, infelizmente; é mais o detalhismo da sigla que me incomoda; mas o que me incomodou mais, desde a caminhada na Cesma, lembrando o chevrola do Fernando é ter fixado minha atenção em um detalhe na verdade insignificante diante do empreendimento como um todo. Aceita meus cumprimentos pelo teu trabalho, Lion.

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